Praia dos Ingleses

Como funciona alargamento em Floripa

Empreendimento na praia dos Ingleses retira sedimentos do fundo do mar e bombeia em direção à praia, com objetivo de ampliar espaço para banhistas.

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Navio russo faz dragagem na Praia dos Ingleses, em Florianópolis, sugando areia do fundo do mar e bombeando para a praia, o que resulta na ampliação da faixa de areia

A obra de ampliação da faixa de areia nos Ingleses, em Florianópolis, teve início no dia 29 de janeiro e deve durar, em média, 45 dias. Ocorre em aproximadamente três quilômetros de extensão da praia e promete alargar esse trecho para 45 metros.

Atualmente, alguns pontos da praia têm no máximo 20 metros, enquanto outros já não têm mais areia alguma e a água bate nos muros, afirma a prefeitura da capital catarinense.

Considerado moderno, esse empreendimento é feito por um navio do tipo draga, que suga sedimentos do fundo do mar e, com ajuda de tubulações, faz o bombeamento em direção à praia.

Uma vez que o navio extrai a areia, ele armazena os sedimentos e navega até um ponto mais próximo da praia. A partir daí, bombeia o material em direção à faixa de areia. Esse ciclo é repetido oito vezes por dia — explica o engenheiro Pedro Tognozzi, engenheiro da DTA Engenharia, responsável pela obra.

Conduzida por um navio do tipo draga que suga areia do fundo mar e bombeia para a praia, a ampliação da faixa de areia dos Ingleses, em Florianópolis, Santa Catarina, é considerada uma obra moderna e que promete dar mais espaço aos banhistas, movimentando o turismo. Mas também há impactos ambientais nesse tipo de empreendimento já realizado em outros pontos badalados do litoral catarinense, como Canasvieiras e Balneário Camboriú.

Segundo o professor da Pós-Graduação em Oceanografia e Ecologia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) Paulo Horta, há efeitos danosos para os animais marinhos da região onde o navio vai atuar. Ao longo dos 45 dias em que ficará retirando sedimentos do oceano, golfinhos, baleias e tartarugas que se locomovem nessa área têm sua vida prejudicada, pois há o barulho da embarcação, o risco de acidentes e, por fim, a dificuldade de alimentação.

“Esses animais têm um sistema auditivo extremamente delicado e dependem da capacidade de percepção do meio em que vivem para se alimentar. Enquanto a draga estiver funcionando no oceano, (os animais) terão sua capacidade de procurar uma presa muito limitada nessa região em que a extração da areia acontece”, diz.Além disso, remexer a areia do fundo do mar acaba trazendo à tona poluentes depositados ali. De acordo com Horta, diversas substâncias nocivas produzidas na cidade se acumulam, ao longo dos anos, nas profundezas das águas. A dragagem acaba redisponibilizando essas substâncias, como fósforo e nitrogênio, que podem induzir a floração de algas tóxicas.

“Por que isso é ruim? Santa Catarina é um dos principais produtores de ostra do Brasil. Essa produção já sofre com o aumento dessas florações de algas tóxicas, chamadas de maré vermelha. Essas obras de dragagem podem aumentar a intensidade e a frequência dessas marés vermelhas”, explica.

Já o professor do Instituto de Oceanografia da Universidade Federal de Rio Grande (Furg) João Luiz Nicolodi entende que é necessário analisar caso a caso para entender quais são os efeitos das obras de alargamento de faixa de areia, também chamadas de engordamento. Mas considera que, no geral, é um tipo de empreendimento com menor impacto, se comparado com o que costuma ser feito.

“É uma obra branda, soft, ou seja, não tem colocação de rocamentos, pedras, muros e espigão, que são coisas que acontecem e costumam transformar de maneira permanente a linha de costa. Essa é a vantagem das obras de engordamento das praias: pode-se recuperar a linha de costa de forma relativamente natural. Tira-se areia de uma área próxima à praia, uma areia que, em muitos casos, já fez parte da praia e tem o mesmo perfil”, observa.

De acordo com a prefeitura de Florianópolis, o navio vai extrair areia em uma jazida no fundo do mar, a um quilômetro da praia, distância considerada curta. Estudos realizados antes do início da obra mostraram que esses sedimentos têm semelhanças com a areia da praia. Após a extração, a embarcação usa de uma tubulação para bombear o material em direção à praia. Chegando lá, é espalhado por escavadeiras e tratores.

Medidas ambientais

Sobre os impactos ambientais, a prefeitura afirmou, em nota encaminhada a GZH, que análises prévias avaliaram todas as consequências da obra. Depois disso, foram sugeridas propostas para reduzir esses danos, além de terem sido criados programas de monitoramento para atender as exigências dos órgãos responsáveis.

“Entre as principais medidas mitigadoras de impactos ambientais do alargamento da faixa de areia nos Ingleses estão a segurança e sinalização de obra, monitoramento do ruído ambiental, gerenciamento de resíduos e efluentes, recuperação da área do canteiro de obras, controle ambiental da atividade de dragagem, monitoramento da biota aquática e terrestre, monitoramento do perfil praial, monitoramento da qualidade das águas e dos sedimentos e recuperação da restinga da praia”, diz o comunicado.

Responsável pelo licenciamento da obra nos Ingleses e por sua fiscalização, o Instituto de Meio Ambiente de Santa Catarina (IMA) reforçou que foram elaborados estudos considerando os impactos físicos, bióticos (relativo aos seres vivos) e socioeconômicos. Na avaliação do oceanógrafo da entidade e doutor em geologia marinha Volney Junior Borges de Bitencourt, é um tipo de empreendimento que traz tanto pontos positivos quanto negativos.

“Há impactos pontuais na fauna próxima à jazida de onde a areia é retirada, e também na praia onde o material é despejado. A praia vai precisar de alguns anos para estabilizar esse novo perfil. Além do mais, a alimentação artificial da areia da praia precisa de manutenção periódica, ou seja, não é permanente”, considera.

“Por outro lado, isso é usado no mundo inteiro, como Austrália e Estados Unidos, e vários estudos mostram a alta capacidade de regeneração da fauna afetada”, finaliza.

Possíveis soluções

O professor Horta observa que as praias estão ficando com suas faixas reduzidas por causa das mudanças climáticas, que geram aumento do nível dos oceanos em decorrência das chuvas, por exemplo, mas também como consequência da ação humana. As dunas, que naturalmente cedem mais sedimentos às faixas de areia, estão ameaçadas pelo avanço de casas e prédios em direção ao mar. Portanto, obras de alargamento não atacam diretamente as razões que fazem esses espaços diminuírem de tamanho.

“Se uma praia está passando por um processo de erosão, não é com alargamento de faixa de areia que vamos deter isso. Vamos apenas retardá-lo. O processo erosivo vai continuar acontecendo. Se quisermos resolver esse problema, temos que combinar outras soluções”, defende.

O professor Nicolodi concorda que ampliar a faixa de areia não freia a erosão das praias, e acrescenta que, para manter o espaço que foi alargado, é necessário fazer manutenções periódicas:

Esse tipo de obra não atua na causa da erosão costeira, não diminui a energia de ondas na praia. É feito o engordamento da praia, que tem vida útil, e, para mantê-lo, é necessário manutenção de tantos a tantos anos, que tem custo elevado.

O ideal, sugere Horta, seria combinar esse tipo de obra com outros métodos. Um deles é o sistema de recifes artificiais, estruturas de concreto que permitem a instalação de diferentes organismos marinhos, como algas e corais, favorecendo o surgimento da fauna e da flora da região. Outra possibilidade são geobags, sacos gigantescos colocados dentro da água para reduzir a energia das ondas e, assim, evitar a erosão da praia.

“Não negamos que é necessário ampliar a faixa de areia de Ingleses pelas questões econômicas que isso implica. Mas precisamos encontrar métodos que mitiguem os impactos ambientais. O Brasil é signatário da Década dos Oceanos, promulgada pela ONU. Portanto, deveríamos estar contribuindo para um ambiente seguro e saudável dos oceanos”, considera.

Fonte Gaúcha ZH / Clicrbs

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