Daniel Rangel

Estreia tensa em Nazaré

"Foi equivalente a uma tentativa de subir o Everest", diz Daniel Rangel sobre estreia em Nazaré. Confira entrevista exclusiva.

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A primeira onda da vida de Daniel Rangel em Nazaré, Portugal.Guilherme Delarue/@guiga222
A primeira onda da vida de Daniel Rangel em Nazaré, Portugal.

Daniel Rangel é um surfista casca-grossa. Após morar por 12 anos no Havaí, Cabeça, como é conhecido, gosta mesmo é de ondas de consequência. Grandes, pesadas e tubulares. E foi uma dessas, uma morra tubular surfada em 2021 em Avalanche (ES), que o levou a Nazaré.

Daniel nunca tinha planejado se aventurar nas maiores ondas do mundo no Canhão português. Mas ao vencer o Prêmio Gigantes do Brasil 2021, ganhou uma vaga para participar da quarta edição do Gigantes de Nazaré. “Não era um lugar que estava nos meus planos. Venho a Portugal há bastante tempo, mas sempre pra caçar os tubos e os slabs”, conta Daniel em entrevista exclusiva ao Waves.

Convidado a participar do evento, ele planejava chegar com calma em janeiro em Portugal para se adaptar com as poderosas ondas da Praia do Norte. Mas uma gigantesca ondulação apontou nos gráficos. A chamada do evento aconteceu poucos dias antes da disputa. “Foi tudo muito rápido. Tive que antecipar minha passagem. Saí do Brasil no dia 5, pousei no dia 6 e no dia 7 estava pela primeira vez em Nazaré, em um dos maiores mares da história”, conta o carioca.

Com bastante vento, havia ondas realmente muito grandes neste dia. Algumas com mais de 20 metros. “No tempo que morei no Havaí, só umas duas vezes vi algo dessa magnitude. Mas não surfamos, só passamos por elas de jet. Então, essas condições de Nazaré foram as mais extremas que já presenciei”, diz.

Em parceria com o chileno Rafael Tapia e Bernardo Mackenzie no segundo resgate, Daniel participou dos dois dias de gravações do Gigantes de Nazaré. No primeiro, sexta-feira (7), Bernardo o colocou em uma boa onda, mas as coisas não saíram como ele gostaria. “O Bernardo me colocou no lugar perfeito e eu vacilei na navegação. Peguei um bump e perdi a entrada. Quando saí por trás, um véu imenso com um arco-íris pairava sobre minha cabeça. Eu não conseguia ver nada além daquela névoa mística”, conta.

O que via podia ser belo, mas ele sabia o que estava por trás. “A névoa dissipou e meu pior pesadelo se confirmou. Completamente em pânico e tentando me acalmar para entrar num estado meditativo, comecei a nadar pra cima da maior onda que já vi na minha vida. Por sorte passei por ela num momento crítico e com uma sensação de quase voltar com o repuxo. A magnitude e volume de água que senti passar por mim foi algo que nunca havia sentido na vida”.

Marco Escadote e Daniel Rangel fogem de uma bombaGeorge Piedade
Marco Escadote e Daniel Rangel fogem de uma bomba

Para a sorte de Daniel, ele conseguiu passar por esta onda e o piloto de regate Marco Escadote conseguiu tirá-lo em seguida da zona da morte. Mas a experiência o deixou com medo, apreensivo. Daniel não se sentia preparado para aquelas condições. Nem fisicamente, nem psicologicamente. “Estrear em Nazaré num swell desse tamanho foi equivalente a uma tentativa de subir o Everest. Cheguei no acampamento base. Já foi uma honra e grande orgulho ver meus amigos atingirem o topo”, desabafa.

No dia seguinte, sábado (8), o mar acordou enorme ainda, mas com menos vento. Dessa vez, estava um pouco mais tranquilo e o Rafael Tapia o puxou em uma boa onda. “As condições estavam mais amigáveis mas ainda estava muito grande e eu estava apreensivo. Mas meu parceiro Rafael me deu uma puxada bem segura mais para o rabo. Ainda dei uma puxada pra dentro, mas fiquei seguro. Deu pra sentir aquela adrenalina, mas foi o que consegui fazer com a confiança que tinha na minha atual forma física. Preferi ficar mais seguro”, conta.

Como se não bastasse, no dia seguinte ao grande swell, Cabeça descobriu que o colete que ele estava usando tinha problemas na vedação. “O colete não estava inflando. Então ainda bem que me assustei e não me coloquei numa situação de risco, porque teria tomado sem colete, e ai sabe lá o que poderia ter acontecido”, agradece.

Nesta quarta-feira (12), Daniel participou do Desafio de Remada do Gigantes de Nazaré. Entrou no mar com sua gunzeira no braço. Enfrentou condições difíceis para remar, ondas de 40 pés (12 metros) aproximadamente, com vento terral forte. Tomou umas bombas na cabeça e segue se acostumando com as dimensões do Canhão. “Fico aqui em Portugal até o final de março, então pretendo sim investir mais tempo aqui em Nazaré. O legal é que aqui você fica muito em forma”, diz Daniel, “Se um dia eu conseguir surfar um mar como o que eu estreei, só que calmo, sem tanta tensão, vai ser muito legal”, finaliza.