Surf trip

Gringo no Brasil dos anos 80

Jornal australiano relembra artigo publicado em 1987, sobre a cultura brasileira, suas ondas, costumes e nuances.

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O campeão brasileiro de 1989: Pedro Muller.Fauze/Tracks
O campeão brasileiro de 1989: Pedro Muller.

O Brasil sempre pareceu exótico aos olhos dos estrangeiros. Contudo, o nosso país com sua dimensão continental em diversas vezes, para não dizer a maioria, surpreende positivamente os gringos que por aqui aportam. Não temos ondas “world class”, muito menos somos conhecidos pelo tamanho de nossas morras, mas há tesouros que se bem garimpados podem fazer a cabeça de qualquer surfista que busque além do surfe em si, experiências multiculturais.

Ao nos depararmos com o artigo publicado em setembro de 1987 pelo no tradicional jornal Tracks (à época impresso) intitulado ‘What Being a Surf Pilgrim In Brazil was like in the late 80’s’ traduzido ao pé da letra algo como: “Como era ser um surfista no Brasil nos anos 1980”. O olhar gringo, nesse caso do jornalista australiano Tim Shingles, correspondente do veículo, que fez uma imersão no país que resultou no artigo Surfing in Brazil the visitor.

Destacamos algumas impressões do jornalista que naquela altura visitava um país no qual a moeda corrente era o Cruzado a inflação estava fora de controle e a população girava em torno de 130 milhões (o último Senso aponta para pouco mais de 203 milhões). O articulista começa afirmando que o Brasil inicialmente pode não ser um destino para aonde se planeje uma surf trip, mas que a aposta pode valer a pena.

“Se alguém procurasse países que oferecessem férias ou viagens repletas de surfe, talvez não desse uma segunda olhada no Brasil. Errado! Embora esse paraíso de cultura e cores, nem sempre ofereça a lendária qualidade e consistência de refúgios de ondas como Austrália, Indonésia ou México, o Brasil definitivamente é um candidato para a viagem de surfe definitiva”.

Joaquina Clássica.Fauze /Tracks
Joaquina Clássica.

E segue discorrendo sobre a similaridade de tamanho entre Brasil e Austrália, manda a letra afirmando que por aqui cerveja, maconha e cocaína são artigos baratos, afirma que a passagem aérea é cara e destaca que o câmbio é bem favorável para quem tem o dólar como moeda. O artigo segue com um show de clichês, alguns deles reais  e parte para o que nos interessa, o surfe. O jornalista inicia falando da relevância do Waimea 5000 de 1977, fala sobre o hiato de provas do circuito até 1986, quando Dave Macaulay venceu o Hang Loose, na Joaquina (SC).

“A boa administração e excelentes ondas resultaram em um campeonato excepcional em todos os aspectos”, diz ele sobre o Hang Loose, evento que marcou a retomada do CT ao Brasil.

O australiano cita Pepê Lopes como um respeitado surfista e piloto campeão mundial de asa delta, e afirma que a dica de Pepê e seus irmão foi para que rumasse para o Sul do país, onde nos anos 1980 eram comuns as barcas cheias de cariocas em busca das ondas da Guarda, Joaquina e adjacências.

“Amigos locais me indicaram ótimos beach breaks na região e várias outras formas de entretenimento. Os melhores picos de onda em Santa Catarina incluem Santinho, Campeche, Armação e Joaquina”, observou.

“O Brasil certamente oferece ao surfista viajante uma experiência única e a oportunidade de surfar ondas verdadeiramente exóticas. Claro, está um pouco fora do caminho, mas todos sabemos que viajar para lugares distantes às vezes resulta em uma viagem de surfe única na vida. Certamente, se você planeja surfar no Peru ou na América Central, não hesite em conferir o Brasil – você não ficará desapontado”.

Outro ponto que merece destaque no artigo é quando o “Festival Hollywood” é citado fazendo alusão ao campeonato que rolava na Praia de Itamambuca (SP).

O hoje shaper, Joca Secco, encara uma junção de responsa.Fauze/Tracks
O hoje shaper, Joca Secco, encara uma junção de responsa.

“Partimos para a costa naquela noite e chegamos à Praia de Maresias pouco depois de meia-noite, onde acampamos no chão na casa de um amigo. A vontade de surfar fez com que todos acordassem cedo, mas descobrimos que o swell estava fraco. Decidimos seguir para a Praia de Itamambuca onde rolava o ‘Festival Hollywood’.

Sobre as performances no evento diz ele:

“Eles (surfistas) claramente tinham muito conhecimento em ondas pequenas, quebrando em ondas de três pés com habilidade e estilo tão bons quanto qualquer surfista de competição que já vi na Austrália”.

O Rio fez parte do roteiro e aqui vemos a percepção gringa da cidade:

“O Rio de Janeiro não é tão consistente quanto a costa sul, mas é um lugar incrível para curtir quando não há ondas. Existem várias praias maravilhosas no Rio ligadas por colinas enormes e acidentadas. No entanto, apenas as praias mais ao sul têm ondas. As famosas praias de Copacabana e Ipanema são estritamente para observar e beber. As brasileiras gostam de usar fio dental e tops de biquíni extremamente pequenos, e as praias do Rio estão lotadas de garotas usando exatamente isso, então leva um tempo para se acostumar quando não há ondas”.

Frajola, surfista da Barra da Tijuca.Fauze/Tracks
Frajola, surfista da Barra da Tijuca.

A trip foi finalizada na nossa Esmeralda do Atlântico:

“A Ilha de Fernando de Noronha é conhecida no Brasil como o ‘Havaí do Atlântico’, e não apenas por seu ótimo clima e água quente e cristalina. Ela apresenta algumas das ondas mais intensas da América Latina e deve ser conferida se você puder arcar com a passagem aérea”.

Confira o artigo na íntegra em inglês.