Muitas Águas

Surf com os tubarões

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Sinalização alerta para a presença de tubarão na praia de Boa Viagem, Recife (PE). Foto: Site Lemangue.com.br.

Esta chamada seria praticamente um título suicida!

 

Quem diria, o Abreus (PE), “vigiado” pelos sharks!

 

Pois é, como já falado aqui em outra matéria sobre o Arrisca Tudo, Gaibú (PE), no começo da década de 1980 eu costumava ir ao Nordeste surfar e pude pegar ondas incríveis, sem crowd, desfrutando de um clima quente e fresco nos meses de inverno, quando “fugia” do frio paulistano nas minha férias de julho.

 

Fiz ótimas amizades, muitos conhecidos (alguns reencontrados agora no Facebook), e muitas praias e point e reef breaks onde surfamos.

 

Muitas vezes, estive com Mike “Summer Birds” em Recife, e então surfávamos por toda aquela região. Mas uma, me chamou a atenção e como eu não tinha experiência de surf internacional em bancadas de coral, fiquei “chocado” com uma onda quase na frente da casa do Pedro Reitler que nos hospedava e que tinha um nome esquisito: Abreus. O pessoal pronunciava “Zabreus”.

 

“Bora surfar nos “Zabreus”, disse Pedro. “A remada é longa mas vai valer a pena”, completou.

 

Lá fomos nós, remando, depois de um café matinal regado à água de coco. As espuminhas foram se transformando em espumas, que viraram ondas de 1,5 metros, super tubulares!

 

Alguns poucos brothers percorriam velozmente aquela onda e nossa fissura surfística só aumentava. A terra, os coqueirais (não o emaranhado de prédios de hoje em dia), iam ficando pequenos e só então tive noção de como estávamos para fora da costa.

 

Foi um dia maravilhoso, inesquecível, internacional. Meus amigos em São Paulo iam achar que eu estaria inventando, aumentando, super dimensionando a proporção daquele mar. Era algo inacreditável, para um Brasil tão “carente” de ondas boas e constantes em fundos de coral, achar aquela jóia em pleno litoral brasileiro, e no Nordeste, quando já naquela época meus amigos falavam: “Você vai surfar no Nordeste? Tá louco, onda tem no Rio, São Paulo e em Santa Catarina. Você vai pegar malária lá!”.

 

Cara, que prepotência, orgulho e ignorância de alguns amigos meus do Guarujá.

 

Sorte minha, sorte nossa que podíamos viver aquilo tudo, na companhia das pessoas mais maravilhosas que já conheci em todas as viagens que fiz em mais de 30 anos de estrada pelo Brasil e pelo globo. O povo nordestino, sabe o que é ser receptivo! E agora também surfando esta e outras ondas incríveis como Serrambi e companhia.

 

Bom, mas eu tinha que registrar fotograficamente aquela proeza. Afinal de contas eu me apresentava como fotógrafo de surf, da recém-lançada Revista Fluir etc e tal.

 

Então, lá fui eu, nadando no dia seguinte, apenas com minha Nikonos IV e um par de pés de pato. Águas tranquilas e em 40 minutos depois de uma boa ginástica aquática dividia o line up com Mike, Pedro e alguns sortudos de plantão.

 

As fotos ficaram boas depois de reveladas e ainda voltei algumas vezes para Recife, mas nunca mais vi o Abreus quebrar daquele jeito, pois costumávamos ficar mais tempo em Maracaípe e Gaibú, bem mais constantes.

 

Hoje, passadas três décadas deste episódio, vendo no caos que se tornou surfar nos arredores de Recife, devido aos contantes ataques de tubarão, deixando uma leva de mutilados de uma geração, imagino a loucura que seria ir até lá surfar remando e ainda mais nadando com apenas nadadeiras e uma câmera na mão.

 

Prefiro guardar em minha memória e nas poucas fotos que fiz a lembrança de uma das ondas mais espetaculares que conheci no Brasil.

 

O Homem tem afetado a natureza de tal maneira que toda fauna e flora gemem de agonia. Um caos apocalíptico!

 

Paremos para pensar e rever nossa conduta.

 

E vida longa aos tubarões, que não fazem nada de mal a não ser buscar seu alimento.