Espêice Fia

Pipe X Teahupoo X Cloudbreak

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John John Florence durante o Volcom Pipeline Pro 2012. Foto: Bruno Lemos / Lemosimages.com.

Quando ainda fazia parte do WCT e, depois da entrada de Teahupoo no tour, eu já era colunista do extinto site Gzero. Em uma das ocasiões, após ver pela primeira vez a ainda pouco famosa onda tahitiana quebrar de jeito, ficava encucado em tentar distinguir as diferenças entre ela e Pipeline. 

 

Certo dia liguei o “gravador” e saí perguntando para vários monstros do surf quais as diferenças entre ambas. Qual seria a mais casca-grossa, a mais difícil de ser surfada etc. 

 

Lembro de ter perguntado isso para Occhilupo, Luke Egan, Jake Paterson, Renan Rocha, Herdy. As respostas eram em torno do power, perfeição, bancada. No entanto, quando alguns não apontavam diferenças, das duas uma, ou o cara era muito fera e destemido, ou já tinha vasta quilometragem em ambas. 

 

 

Fred Patacchia contempla a perfeição desafiadora de Teahupoo, Tahiti. Foto: Bruno Lemos / Lemosimages.com.

A maioria estava mais acostumada a surfar Pipe, e quase sempre achavam que a joia havaiana era menos complicada.  Pra mim, era mais fácil surfar Teahupoo, pois investindo horas no pico desde minha primeira trip ali, me sentia mais confortável, começava saber para onde remar e aonde dropar. 

 

 

Logo isso se traduzia em confiança. O fator treino e quilometragem era explícito quando alguns caras que eu sabia que eram dropadores das bombas de Pipeline, puxavam o bico em algumas ocasiões.

 

Em 99, em sua segunda edição com mar bombando, vi ondas dropáveis sendo deixadas passar por caras como Jhonny Boy Gomez, Lian MacNamara e Tamayo Perry.

 

Este último, com menos idade e mais conhecido das novas gerações. 

 

 

Kohl Christensen num Cloudbreak sem comentários. Foto: Bruno Lemos / Lemosimages.com.

Normalmente os caras botavam e botam pra baixo, mas ali tinham menos conhecimento. Logo valia a pena analisar situações. Mesmo surfando no Hawaii desde a temporada de 88, passei a desempenhar melhor em Pipe graças à Teahupoo, pois lá no início de sua fama, havia menos crowd e dava pra treinar mais. 

 

 

Havia pego a manha de jogar o peso pra baixo e pra fente na hora do drope. No entanto, fazer a leitura da onda já era outra coisa. Saber onde as séries vinham era totalmente diferente. Em 2003, em uma bateria em que estava o havaiano Shane Dorian, fiquei abismado quando ao entrar no mar no começo da bateria, ele remou rápido e achou uma onda pro Backdoor que eu jamais visualizaria. 

 

A não ser que lá fosse meu quintal, meu local diário de treinos, minha pista para fazer quilometragem. Já vi outros surfistas passarem pela mesma situação e, por curiosidade, incluindo o famoso take off do Tom Caroll ao lado da lenda Derek Ho. 

 

Só que ali, o fator casa inverteu-se para o fator coragem, o extinto “go for it” do autraliano. A cena era Derek freiando e Caroll virando pro take off sem nem olhar para trás. Claro que também já vi o havaiano fazendo o mesmo em outras ocasiões em relação a outros surfistas, pois não à toa obtém o título de Pipe Master. 

E a briga é grande quando tem duas feras, dois caras calejados na situação em que ambos podem pregar peças em um final de bateria. Foi assim em um dos eventos em que Andy Iros mandando pro Backdoor virou em cima de um Kelly que também por sua vez já virou “n” vezes em cima de outros. 

 

Foi assim que o jovem talento Jonh Jonh virou em cima do mestre O’Brien no último Qs disputado ali. Mas o engraçado era que antes as atenções eram mais voltadas apenas para estas duas ondas. E, apesar de Cloudbreak aparecer para o mundo antes de Teahupoo, nunca havíamos sido noticiados demasiadamente, ou pelo menos pela imprensa brasileira, por swells enormes como nos dois últimos anos.  

 

Já surfei Cloudbreak com 8,10 pés e séries maiores na companhia de Yure Sodré, Peterson Rosa e Rodrigo Dornelles. Uma vez chegamos antes do circo da ASP. Na ocasião, as ondas estavam muito potentes, aliás esta é uma das características daquela bancada oceânica. 

 

E fazendo uma comparação entre as três potencias, me arrisco a dizer que a mais difícil talvez seja Cloudbreak. Tudo bem que tratando-se de Pipe, o Backdoor pode funcionar também. Mas, tirando este fator, a clássica de Fiji é mais extensa, existe um double up em uma das seções. Ora o tubo pode quebrar mais em baixo, ora pode quebrar mais em cima da parede. E isso tudo em alta velocidade. 

 

Para um Kelly Slater, parece brincadeira de criança. Aliás, para o americano é realmente uma brincadeira de criança, pois desde jovem, frequenta a onda, uma das mais caras para surfar, isso se o visitante quiser hospedar-se próximo, ou seja, do outro lado do canal. 

 

Enquanto outra esquerda como G.land ou Arica não voltar ao tour e quebrar como estas três em questão, o páreo ficará entre elas que, saindo na frente este ano, tem Cloudbreak na memória por recentes massarocas dropadas por Kohl Christensen, Reef Macintosh, Mark Healay, Ramon Navarro e Gudauskas, entre outros que estavam naquele swell em que a ASP desistiu do dia de disputas pra dar lugar ao free surfing. 

 

Com Teahupoo a caminho, fico ansioso e me lembrando de como é adrenalizante estar ali no pico, ou naquele canal, perto das bombas. E que passando de 12 pés fica impossível de dropar sem auxílio de artifícios extras. Torcendo para que todas quebrem de gala e, quando Pipe fechar temporada, poderemos também do outro lado da tela dar nosso palpite sobre as três mais-mais do tour. 

 

Fábio Gouveia
Campeão brasileiro e mundial de surfe amador, duas vezes campeão brasileiro de surfe profissional e campeão do WQS em 1998. É reconhecido como um ícone do esporte no Brasil e no Mundo. Também trabalha como shaper.