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Pipe Masters, o maior do mundo

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Kelly Slater já protagonizou bom momentos em Pipeline, Hawaii. Foto: Bruno Lemos / Liquid Eye.

O eterno Mr. Pipe Gerry Lopez. Foto: Bruno Lemos / Lemosimages.com.

Tudo começou no inverno de 1971, quando o visionário surfista e empresário Fred Hemmings, campeão mundial de 1968, teve a ideia de reunir seis grandes surfistas, com uma estrutura mínima – diga-se, uma mesa de madeira na areia e um troféu –, para disputar um campeonato na onda mais temida do planeta, “Banzai Pipeline”. Depois de um mal entendido – ou talvez uma “crocodilagem” – entre Corky Carroll e o eterno Mr. Pipe Gerry Lopez, onde Corky teria dito a Lopez que o campeonato não seria realizado naquele dia, em razão das condições do mar (que, de fato, eram fracas), o primeiro Pipe Masters acabou acontecendo, sem a presença de Gerry, franco favorito na época, e o lendário californiano Jeff Hackman tornou-se, oficialmente, o primeiro mestre de Pipe.

 

No ano seguinte, em condições épicas, o Mr. Pipe Gerry Lopez tratou de chegar cedinho no pico e, confirmando o seu favoritismo, desbancou todos os adversários, esbanjado técnica e estilo (com aquela postura bem relaxada que tornou-se sua marca registrada), completando lindos tubos e fazendo aquela onda rápida e traiçoeira parecer fácil de ser domada – pura Ilusão –, sagrou-se campeão do evento e, desde então, jamais perdeu o posto de verdadeiro e único rei de Pipe.

 

Poucos anos depois, em 1975, foi a vez do sul africano Shaun Tomson chegar, literalmente, metendo o pé na porta, para surpreender o mundo. Surfando com uma prancha cor de rosa, com um rocker muito acentuado para aquela época, que o permitiu surfar a temida esquerda de backside quebrando a linha da onda e se reposicionando, constantemente – o que, no início doas anos 70, não era comum em Pipeline –, e conquistando o campeonato e, principalmente, colocando um ponto final na hegemonia havaiana, no pico.

 

Outro Pipe Master que, merecidamente, entrou para a galeria de clássicos foi o de 1982, onde o havaiano Michael Ho, em uma performance inesquecível, com o antebraço engessado – o que o atrapalhou um pouco na remada –, deu início a uma nova era de surf de backside em ondas cavadas, pois por entrar nas ondas mais atrasado, Michael utilizou o grab rail desde o momento do drop, o que o permitiu entubar cada vez mais profundo e sair da água como verdadeiro herói do North Shore. Aquela imagem de Michael Ho com o braço engessado entubando de backside marcou gerações!

 

No ano seguinte, foi a vez de outro havaiano consagrar-se Mr. Pipe. O talentoso bad boy Dane Kealoha, com um surf veloz e estilo atemporal, usando uma prancha menor do que a maioria dos competidores, levou  para casa o caneco explorando, principalmente, as direitas do Backdoor. Isso porque, até poucos anos antes, Pipe era exclusivamente a temida “esquerda”.

 

Após praticamente uma década, em 1991, o mundo presenciou uma das maiores atuações de um surfista no Pipe Master. O baixinho australiano Tom Carroll, na época já 2 vezes rei de Pipeline, foi protagonista de uma performance que entrou para a história, com duas notas 10, na final. Carroll, surfando de capacete, mandou aquele famoso snap na parede na onda, com uma bancada super rasa e afiada logo embaixo, e depois completou um drop totalmente atrasado, demosntrando muita coragem e comprometimento, para buscar a segunda nota 10 da bateria final e o tri-campeonato. Que atuação!

 

Em 1995, em condições perfeitas, os sortudos que estavam na areia – dentro dágua nem se fala – do Ehukai Beach Park presenciaram a histórica semifinal entre Kelly Slater e Rob Machado. Os dois amigos, que estavam disputando ali o título do WCT, deram um show nas esquerdas e direitas tubulares e, como se estivessem em uma session de free surf, trocaram um “high five”, após um tubão de Slater, que acabou levando a melhor e, em seguida, derrotou Occy, na final, conquistando o Pipe Master, a Tríplice Coroa e o WCT.

 

Mas nem todas as lembranças de Pipeline são felizes para Kelly. Após ficar afastado do circuito por algum tempo, nos anos 90, o americano retornou com tudo e travou lindas batalhas com o herói havaiano Andy Irons. Na temporada de 2003, a disputa do título, mais uma vez, ficou para a última e principal etapa, em Pipeline. Os dois surfistas chegaram à bateria final e o local havaiano demonstrou todo o seu conhecimento do pico e não deu chances para Slater, que saiu da água muito abalado. Esse pódio foi, particularmente, emocionante.

 

São muitas histórias e glórias, o que engrandece, cada vez mais, este campeonato. Mas, na verdade, o que torna o Pipe Masters o maior campeonato do mundo ainda é aquela temida esquerda, penteada pelo vento terral, quebrando com perfeição sobre uma rasa bancada, a poucos metros da areia.