Palanque Móvel

Guerra do biquíni

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Alana Blanchard é atualmente uma das mais influentes surfistas da modalidade feminina. Foto: Alanablanchard.com.
Alana Blanchard é provavelmente uma das mais influentes surfistas da modalidade feminina na atualidade. Apesar de não ser e nem nunca ter sido séria candidata ao título mundial, só de fazer parte da elite mostra o quão habilidosa essa menina é na água. Mas, suas habilidades, na verdade seus atributos, se destacam mais acentuadamente fora dela, por onde ela passa e principalmente no mundo virtual.
Alana é uma modelo de jovialidade, sensualidade e feminilidade dentro de um mundo tradicionalmente masculino e bárbaro que é o do surf. É bom lembrar que essas meninas têm que dividir onda igualmente com todos durante suas sessões de free surf e, seja no Hawaii ou na praia de Copacabana, é preciso ter coragem para encarar um mar cheio de marmanjos. Não duvide da coragem de Alana e nem de nenhuma dessas surfistas, muito menos da força de vontade e perseverança, características necessárias a qualquer uma que conquista o que ela conquistou.
Mas, o que muitos vêm questionando é se esse padrão de menina surfista / modelo de biquínis não está transcendendo demais a atividade em si. Alana tem milhares de fãs e, provavelmente, uma grande parte nunca a viu surfar. Talvez por falta de interesse no esporte, mas muito mais justificável é que o que interessa à maioria não é o surf de Alana, e sim a sua beleza. Muitos até já a viram surfar, mas provavelmente não lembram de mais nada além do seu bottom turn, e não por causa da expressividade ou do arco da manobra, e sim de Alana.
Críticas foram feitas à divulgação do Roxy Pro France, na qual uma surfista aparecia acordando e indo surfar de forma super sensual. Não havia nenhuma onda nesse vídeo, que foi tachado até de machista por explorar apenas o lado objeto das mulheres. As polêmicas se multiplicaram na internet e, no fim das contas, a etapa nem chegou a acontecer por falta de ondas (foi adiada para outro lugar, em outra data). Ironias à parte, o campeonato se resumiu a fofocas e falatórios, certamente prejudiciais para aqueles que realmente queriam ver o surf.
Alana tem um discurso debaixo do braço para se defender, que soa bastante plausível à primeira vista. É fato que tanto o surf quanto outros esportes tradicionalmente de homens, estereotipavam suas primeiras praticantes mulheres como sapatões, machonas. Por muito tempo o surf feminino teve esse estigma e suas praticantes sofriam com essa generalização.
Alana sentiu que poderia combater essa imagem e, junto com uma nova geração de meninas muito mais meninas que as das outras gerações, criou uma nova imagem para a surfista, não apenas profissional, mas em geral. Ninguém mais vê com um pé atrás aquela menina bonitinha que quebra nas ondas, e dificilmente vamos pôr em xeque a sexualidade delas. Nem se pensa mais nisso. Nesse sentido, vitória para Alana e suas amigas, que quebraram um preconceito.
Mas existe um outro lado, que torna contraditória essa luta de Alana contra a antiga imagem das surfistas. Ela luta para apagar um estereótipo através do uso de outro estereótipo. E se agora simplesmente não se liga mais para a sexualidade da surfista, estamos começando a vê-las, por outro lado, como patricinhas, grudadas em seus celulares e demasiadamente preocupadas com a aparência.
Tudo bem, são mulheres. Mas, elas não deveriam se destacar das demais pelo foco no esporte que praticam profissionalmente? Esse é um modelo de atleta ou simplesmente um modelo? Não estou dizendo que elas, ou no caso Alana Blanchard, não são focadas e dedicadas ao surf, mas que esse lado é muito pouco explorado. E, por mais que ver uma menina na água de micro biiquíni e maquiada não incomode ninguém, incomoda o fato de, novamente, o surf feminino estar se estigmatizando com um padrão específico. Lésbicas ou super modelos de passarela, por que elas não podem ser simplesmente surfistas?