Leitura de Onda

30 x Tríplice

0

 

Fred Hemmings, criador da Hawaiian Triple Crown. Foto: Bruno Lemos / Liquid Eye.

A Tríplice Coroa Havaiana nasceu para ser a joia competitiva do surf mundial. É tradicional, ocorre em três picos considerados emblemáticos no esporte e num momento em que todos os melhores surfistas do mundo se apertam na Costa Norte de Oahu.

 

Em seu aniversário de 30 anos, é hora de comemorar performances históricas, disputas inesquecíveis, dezenas de títulos conquistados e ondas poderosas para todos os gostos, em Haleiwa, Sunset e Pipeline.

 

Nesses palcos, o que se viu foi, sem qualquer exagero, a consolidação da história do surf competitivo moderno.

 

Sempre que vejo a Tríplice Coroa tenho a sensação de que as duas primeiras etapas, que atualmente integram a divisão de

John John Florence, campeão da Triplíce Coroa de 2011. Foto: © ASP / Kirstin.

acesso, pertencem naturalmente à elite. Algum desvio de curso, promovido fora d’água, tirou da Tríplice Coroa o peso que ela sempre mereceu ter. Torço para que um dia a rota seja corrigida.

 

Estava cá passeando pelo sítio da Copa do Mundo de Sunset quando achei, numa página perdida, o PDF de um folheto comemorativo legal dos 30 anos dessa trinca de eventos. 

 

O texto fala sobre o início de tudo, em 1982, quando Fred Hemmings, em busca da afirmação do North Shore como palco principal do circuito mundial, nomeou os tradicionais eventos havaianos de Duke Kahanamoku Invitational, World Cup Sunset e Pipeline Masters. 

 

No ano seguinte, 1983, Hemmings decidiu juntá-los numa Tríplice Coroa, para estimular o esporte, em geral, os locais, em particular. A edição de 2012 é, portanto, a 30ª da história.

 

Hemmings foi bem sucedido em sua estratégia. O predomínio dos havaianos é evidente ao longo do folheto. Sunny Garcia, por suas performances em Haleiwa e Sunset, é o maior vencedor da Tríplice Coroa, com seis títulos: 1992, 1993, 1994, 1999, 2000 e 2004.

 

Se a tática protecionista contribuiu (além das boas performances dos locais, claro) para render canecos para a ilha, os melhores momentos da Tríplice Coroa aconteceram quando havaianos destruíram de forma totalmente legítima os melhores do mundo. 

 

É o próprio Sunny, o maior vencedor, que declara, no texto, qual foi o grande momento da história do evento: a final de 2006 do Pipe Masters, quando o local Andy Irons virou de forma sublime em cima de Kelly Slater, numa das melhores baterias da história.

 

Pois Andy é, por direito, o verdadeiro símbolo da história da coroa. Venceu o ranking formado pela trinca de eventos duas vezes menos que Sunny (2002, 2003, 2005 e 2006), mas ofereceu ao público performances sublimes em todos os tipos de onda, especialmente na joia mais valiosa, Pipeline. Andy foi o verdadeiro campeão havaiano.

 

Andy teria vencido sem qualquer proteção de locais, sem qualquer intimidação truculenta, sem qualquer omissão de julgamento. 

 

O Havaí tem, agora, outro fora de série a carregar o legado de Andy: John John Florence. O garoto foi campeão da Tríplice Coroa ano passado e, ao que parece, está fadado a conquistar o maior número de coroas da história.

 

É outro que não precisaria de proteção para brilhar. De vantagem, basta – como deveria ter bastado sempre – o fato de ter nascido a um passo das ondas mais poderosas do mundo.

 

Outras nacionalidades brilharam nessa história: da Austrália, surgiram nomes como Tom Carroll (1991) e Joel Parkinson (2008, 2009 e 2010) e, dos EUA, Kelly Slater (1995 e 1998).

 

Falta, ao Brasil, protagonismo na disputa. Na história da Tríplice Coroa, temos dois títulos em eventos – dos bravos Fábio Gouveia e Raoni Monteiro, ambos conquistados em dias de ondas menores em Sunset, sem que isso desmereça o brilho dos surfistas – e alguns vices, em Sunset e Haleiwa.

 

Nenhuma vitória ou vice em Pipeline. Nenhuma tríplice coroa. 

 

Os brasileiros já consegue exercer força em quase todas as grandes arenas do esporte. Estão chegando ao momento de superar os obstáculos existentes dentro e fora d’água também em Oahu, para que os tentáculos tupiniquins alcancem a coroa e seu evento mais importante.

 

 

Tulio Brandão é jornalista, colunista do site Waves e autor do blog Surfe Deluxe. Trabalhou nove anos no Globo como setorista de meio ambiente e outros três anos no Jornal do Brasil, onde cobriu surf e outros esportes de prancha. Atuou ainda como gerente de Sustentabilidade da Approach Comunicação. Na redação, ganhou dois prêmios Esso, um Grande Prêmio CNT e um Prêmio Abrelpe. 


 

Tulio Brandão
Formado em Jornalismo e Direito, trabalhou no jornal O Globo, com passagem pelo Jornal do Brasil. Foi colunista da Fluir, autor dos blogs Surfe Deluxe e Blog Verde (O Globo) e escreveu os livros "Gabriel Medina - a trajetória do primeiro campeão mundial de surfe" e "Rio das Alturas".