O adeus de Deborah Farah

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Sylvio e Deborah no Surf Bar Legends, em Maresias. Foto: Nancy Geringer.

“Queridos amigos, é com muita emoção que envio o último texto escrito por Deborah Farah, minha eterna alma gêmea. Estava vasculhando seus arquivos em meu laptop quando encontrei esse texto, que eu nem sabia que ela havia escrito na semana passada. Só estava faltando a última revisão, que fazíamos sempre juntos. É chorando, mas com imenso orgulho, que o envio”, Sylvio Mancusi.

 

O e-mail acima nos foi enviado por nosso amigo e colaborador Sylvinho Mancusi, namorado de Deborah, que sempre foi um guerreiro. Temos certeza que ele irá superar mais essa batalha imposta pelo destino.

 

Abaixo publicamos na íntegra as últimas palavras escritas por Deborah Farah. Uma nova era do surf feminino no Brasil Por Deborah Farah Ao contrário do que acontecia nas décadas passadas, hoje o surf é um esporte reconhecido em nosso país, com destaque e espaço na mídia cada vez maior. Graças a Deus! Agora estamos colhendo os frutos de uma batalha que teve início nos anos 70, quando os surfistas pegavam onda puramente pelo amor ao esporte e pelo companheirismo e união predominantes na época – que eram o combustível para mantê-los sempre em busca de seus ideais.

 

Os anos passaram e os tempos mudaram. A cada geração de surfistas, novos horizontes foram conquistados. Eu, que comecei a surfar no inicio dos anos 90, acompanhei de perto a fase radical dessa batalha. Principalmente no que diz respeito ao surf feminino. Quando comecei, fazia apenas três anos que o esporte havia se profissionalizado no Brasil – e apenas para os homens, pois mulheres surfistas no Brasil eram uma espécie rara. Nos primeiros anos, me aventurava em campeonatos locais amadores, só por diversão. Mas, na categoria feminina a gente já entrava na final direto, pois só havia quatro ou cinco competidoras.

 

De vez em quando, em campeonatos de nível estadual, dava para formar duas semifinais, com quatro competidoras cada. Às vezes tínhamos que sair pela praia catando meninas para participar. Isso foi em meados dos anos 90. Quando as cariocas começaram a participar do circuito paulista amador, em 97, tudo mudou. Com a presença de surfistas experientes como Andréa Lopes e Brigitte Mayer no circuito, o nível técnico das atletas foi aumentando gradativamente, assim como a competitividade.

 

E assim as coisas foram evoluindo e melhorando, já que, paralelamente, também crescia o interesse dos patrocinadores e da mídia em relação ao surf feminino. Para completar o processo de crescimento, as surfistas Jacqueline Silva, de Santa Catarina, e Tita Tavares, do Ceará, começavam sua participação no circuito mundial. Em 97, conquistei o primeiro título profissional da categoria. Em 98, foi realizado o primeiro campeonato e também o primeiro circuito exclusivamente feminino, composto por três etapas.

 

Era o Festival Surf Trip de Surf Feminino, vencido por Brigitte Mayer. Em 99, quem levou o circuito e, conseqüentemente, o título brasileiro Pro, foi Andréa Lopes. Enquanto isso, Tita e Jacque estreavam no WCT. Mas foi na virada do milênio que veio a maior de todas as mudanças: o Super Surf. Criado nos moldes do circuito mundial, o novo circuito brasileiro, fechado para os 44 melhores surfistas do masculino as 15 melhores do feminino, corresponde a primeira divisão do brasileiro profissional, enquanto o Super Trials corresponde à divisão de acesso.

 

Graças ao esforço dos organizadores e do investimento da Abril Eventos e de outras empresas que acreditaram no esporte, o surf finalmente decolou no país. Composto por seis etapas e com premiações nunca antes oferecidas num circuito nacional, o Super Surf brilhou em seu primeiro ano, tendo Tita Tavares e Peterson Rosa como os grandes campeões brasileiros de 2000. E o país também segue muito bem representado no exterior, principalmente por Tita e Jacque, que estão cada vez mais perto do título mundial de surf feminino.

 

Já na disputa pelo título nacional, a briga maior está entre Juliana Guimarães e Andréa Lopes, ambas do Rio de Janeiro. A grande decisão será na última etapa, em Imbituba, entre os dias 5 e 11 de novembro. De qualquer forma, quem sai ganhando somos todos nós, surfistas profissionais, graças a uma batalha iniciada nos anos 70, mas que ainda não terminou. A luta por espaço, retorno e reconhecimento continua!