Leitura de Onda

A festa do píer

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US Open em Huntington Beach: evento clássico da Califórnia. Foto arquivo: Marcelo Bolão / Yourself.com.br.

O US Open é um daqueles eventos que você ama ou odeia. É a celebração da competição no formato festa, com shows, pistas de skate, gatas, movimentação intensa de mercado e jovens se apinhando para ver um pouco de tudo, até mesmo os melhores do mundo nas ondas medíocres de Huntington Beach.

 

Eu particularmente apoio o formato. Vejo um espaço confortável para a coexistência dos dois mundos – o das ondas perfeitas em paraísos distantes e o dos grandes festivais nos centros urbanos, onde o esporte forma opinião e pulsa como comportamento. 

 

Com a explosão das manobras aéreas no cenário competitivo, essas competições em ondas curtas como a do píer americano ficaram ainda mais saborosas. Agora, o espectador não perde o seu tempo vendo apenas um Dave Macaulay da vida ensaboar a onda com sete manobras sem expressão. Normalmente, ganha quem traz a surpresa, quem tira o coelho da cartola.

 

Brasileiros têm longa tradição naquela praia, desde os tempos de Neco e Fabinho, que certa vez dividiram uma final de WCT ali. Hoje, a fama de melhor do mundo em ondas sofríveis costuma ser uma crítica velada de quem quer rebaixar o povo de Pindorama. 

 

Mas não importa: é sempre melhor reforçar a condição de líder das ondas pequenas e irregulares do que deixar os estrangeiros recuperarem o posto. 

 

A chave das oitavas-de-final do evento deste ano foi uma boa mostra da superioridade brasileira. Classificaram-se diretamente para a fase, sem rodeios nem repescagem, Filipe Toledo, Miguel Pupo, Jessé Mendes, Gabriel Medina e Adriano de Souza.

 

Na final, pode ser que nem dê Brasil. Aliás, quase nunca deu. Mas não importa: todo mundo sabe – até o garoto californiano que confunde Buenos Aires com Brasília – que os brasileiros dominam o mundo naquelas ondas. Aliás, o que não falta é fã rodeando Medina e cia.

 

No meio de tanta festa, me chamou atenção o título de uma matéria sobre o sexto dia de prova no site oficial do evento. O texto falava exatamente sobre o domínio brasileiro, num dia em que cinco das oito vagas para as oitavas-de-final conquistadas sem repescagem eram de brasileiros. Jessé, Pupo, Medina, Toledo e Mineiro. 

 

Nada mais óbvio, a não ser pelo fato de o título omitir apenas um dos cinco: ele mesmo, Adriano de Souza. Não vou ficar aqui procurando pelo em ovo. Acredito sinceramente que tenha sido apenas um lapso de quem deu o título à matéria. É que minha lógica de jornalista diz que, se você fala de domínio, deve citar todos os exemplos que confirmam a sua tese. 

 

E Adriano estava lá, dentro d’água, em plena forma. No fim, foi apenas mais uma daquelas terríveis coincidências que tornam Mineiro ainda mais brutalmente competitivo. 

 


Tulio Brandão é jornalista, colunista do site Waves e autor do blog Surfe Deluxe. Trabalhou nove anos no Globo como setorista de meio ambiente e outros três anos no Jornal do Brasil, onde cobriu surf e outros esportes de prancha. Atuou ainda como gerente de Sustentabilidade da Approach Comunicação. Na redação, ganhou dois prêmios Esso, um Grande Prêmio CNT e um Prêmio Abrelpe.

 

 

Tulio Brandão
Formado em Jornalismo e Direito, trabalhou no jornal O Globo, com passagem pelo Jornal do Brasil. Foi colunista da Fluir, autor dos blogs Surfe Deluxe e Blog Verde (O Globo) e escreveu os livros "Gabriel Medina - a trajetória do primeiro campeão mundial de surfe" e "Rio das Alturas".