Dadazinho

Subvertendo a ordem

Ex-morador da Cidade de Deus, Dadazinho relembra evento que o alçou à elite do surfe profissional brasileiro.

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Os eventos regionais amadores são a primeira prova de que um surfista leva jeito pra coisa. A partir do sucesso nas categorias de base e sucessivamente nos circuitos profissionais, o atleta pode se considerar apto para alçar voos maiores, nacionais e internacionais. Salvo algumas exceções, como a do nosso personagem em questão, uma boa estrutura na maioria das vezes define o sucesso ou derrocada de um atleta.

Alexandre Almeida, o Dadazinho, subverteu a ordem ao tornar-se um dos surfistas mais respeitados nacional e internacionalmente, mesmo sendo oriundo da famosa Cidade de Deus, a CDD, comunidade na Zona Oeste carioca, imortalizada através do filme de Fernando Meirelles.

Uma postagem feita no Instagram pelo cinegrafista Marcio Fortes, que registrou muita coisa do surfe anos 1990 e 2000, mostra o dia em que Dadazinho deixou de ser uma promessa para tornar-se um Surfista Profissional, assim mesmo, com letra maiúscula.

O post com imagens extraídas do programa Esporte Espetacular, da Rede Globo, também mostra momentos do longboard e feminino, além de registrar o então jovem surfista, aos 16 anos, ficando com a terceira colocação na última etapa do saudoso Limão Brahma, Circuito de Surfe Profissional do Rio de Janeiro, em 1994.

Na ocasião, o Circuito Mundial ainda não era uma realidade consolidada para os brasileiros e o coro comia nos regionais. Nomes como Dadá Figueiredo, vencedor da etapa; Guilherme Gross (bicampeão estadual naquele ano), Ricardo Tatuí, Pedro Muller, Rodolfo Lima, Renato Phebo, o hoje shaper Claudio Hennek (então Claudio Walter), João Gutemberg e Sérgio Noronha ilustram a cena da época.

Sérgio Noronha segue quebrando as valinhas do Meio da Barra.

Além de uma galera da pesada de outros estados que vinha ao Rio para dar aquela dura nos cariocas, como relembra Sérgio “Fedelho” Noronha:

“As etapas do Limão Brahma no Rio de Janeiro eram muito fortes e recebiam competidores do Brasil inteiro para competir com a gente. Lembro que Nelson Ferreira e Felipe Dantas, que moraram aqui, Tinguinha Jojó de Olivença, Picuruta, Ricardinho Toledo, entre outros. Então tinha a galera forte aqui no Rio, como o Pedro Muller, Tatuí, ainda tinha essa turma de fora vindo com tudo. Essa etapa dai foi bem acirrada. O Dadá arrebentando na marola como sempre, e o Dadazinho vindo com tudo, levinho. Eu cheguei na final, representando os locais, dei uma dura, mas acabou que o Dada Levou. O Dadazinho estava começando a mostrar o que os amadores continuavam a fazer estragos entre os profissionais, assim como eu fiz em 1986 na Joaquina”, relembra Fedelho.

Perguntamos ao Dadazinho o que ele lembra desse evento:

“Esse foi um dos momentos mais irados de tantos que eu tive como profissional, porque alavancou minha carreira. Na época eu era Mirim e estava virando Junior. Meu patrocínio era a almejada Equipe Company Cyclone, do visionário Roberto Valério. Lembro que na época ele sempre me colocava pra competir em uma categoria acima, para que eu me preparasse para a profissionalização. Eu era Mirim e competia na Junior e na Open também. E isso serviu para eu me amadurecesse, pois competia com caras que às vezes estavam quase se profissionalizando”, avalia.

Dadazinho segue surfando e compete em alguns eventos Master.@joao.bolha
Dadazinho segue surfando e compete em alguns eventos Master.

“Após a morte do Valério, esse Limão Brahma foi o primeiro campeonato que competi representando a Arrebentação, meu patrocinador da época. Lembro que na semana do evento eu tive uma diarreia danada. Cheguei para o Jê (Jerônimo Telles, ex-surfista profissional carioca) que era o técnico da equipe e perguntei se eu poderia cancelar a inscrição, e claro, não podia. E então eu fui seguindo no campeonato, passando as baterias. Lembro que no sábado anterior à final, eu havia encontrado meus amigos da Praça Seca (bairro do subúrbio carioca) e comentei que estaria na semifinal que seria realizada no domingo. Eu achei que não ia ter ninguém, mas pra minha surpresa a galera compareceu em peso. E na final, quando sai, o pessoal me carregou no colo gritando meu apelido naquela época “Chupeta” e subúrbio! Foi demais a energia”, relembra.

“Foi uma história bacana de um menino da Cidade de Deus que passava perrengue para chegar na praia e de repente estava sendo carregado pelos amigos por um resultado como surfista. Esse evento foi um divisor de águas em minha profissão, foi mágico! E a partir daí me senti um surfista profissional”, conclui o hoje professor de yoga, Alexandre Almeida.