A Pedra e o Farol

Documentário chega a Floripa

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Tudo começou na infância, com aquela misteriosa espuminha branca, que vez ou outra surgia no horizonte distante, quando o mar estava revolto na praia de Jaguaruna. Com o passar dos anos, o mistério foi aos poucos se dissipando: era uma laje, uma montanha submersa a cinco quilômetros da costa onde os pescadores, em dias de calmaria, capturavam toda sorte de pescados. “Mas será que dá pra surfar lá?” A pergunta ficou sem resposta até os anos 2000, com o surgimento dos jet skis e dos primeiros surfistas que começaram a desbravar a onda e a divulgar os primeiros registros.

 

Nesta época, eu já estava envolvido com produção audiovisual e o meu desejo de conferir a onda de perto e registrá-la em um documentário sobre a região começou a ganhar forma, ainda mais quando descobri em um livro que o Farol de Santa Marta, – construído em 1890 no primeiro costão abrigado do litoral brasileiro ao sul do litoral brasileiro -, emitia um feixe vermelho de luz avisando os navegadores a desviar da rota de colisão com a laje, então conhecida como Pedra do Campo Bom.

 

E foi a partir desta relação que surgiu o documentário A Pedra e o Farol, uma obra que registra a história da ocupação do litoral dos municípios de Laguna e Jaguaruna, abordando a importância do surfe nas praias do Cabo de Santa Marta, além da história da descoberta e popularização da Laje da Jagua.

 

Com depoimentos de surfistas renomados como Carlos Burle, Rodrigo Resende e Fabio Gouveia, além dos surfistas locais mais assíduos do pico, como Thiago Jacaré, Fabiano Tissot, João Capilé, André Paulista e João Baiuka, o roteiro registra como um, até então pouco conhecido reduto de pesca, com o passar dos anos viria a tornar-se um dos mais icônicos picos de ondas grandes do Brasil.

 

A primeira expedição de exploração da Laje para o surfe ocorreu em 2002, idealizada pelo falecido Zeca Sheffer, que foi o grande pioneiro da Laje.

“Nós saímos num fim de tarde para procurar uma laje, que nem sabíamos direito onde era. Quando chegamos lá já estava escurecendo e tivemos que voltar na escuridão”, relembra Resende, companheiro de Zeca na aventura.

 

Era a época da explosão do tow in e a laje é o tipo de onda que só pode ser explorada a partir do surgimento do jet ski, utilizado como uma ferramenta de locomoção e resgate. Em 2006, aconteceu o primeiro campeonato de surfe rebocado na Laje da Jagua com a presença dos principais big riders do país e que rendeu uma visibilidade nacional à então desconhecida praia de Jaguaruna.

“Além de provar que o Brasil tem ondas grandes, nossa intenção sempre foi valorizar o município, pois pouca gente conhecia Jaguaruna”, explica Thiago Jacaré, o surfista local com mais bagagem nas ondas da Laje.

 

Cinco anos mais tarde seria realizado o segundo evento, desta vez realizado pela Atow-inj (Associação de Tow-in de Jagauruna) em memória à Zeca Sheffer com ondas de quase quatro metros na rasa bancada de direita.

“A Laje está no topo entre as cinco melhores ondas para a prática do tow in no Brasil”, afirma Carlos Burle, campeão das duas edições do evento em dupla com Eraldo Gueiros. Com a retomada do surfe de ondas grandes na remada, a onda da Laje também passou a ser surfada no braço, especialmente a esquerda que oferece uma parede mais amigável.

 

Registrar a ação nas ondas da laje também é um grande desafio e estas dificuldades fazem parte do roteiro do filme. O filme conta com imagens de acervo do cinegrafista local Lucas Barnis que frequenta o pico desde 2005 e já perdeu vários equipamentos lá. Na busca por imagens inéditas, a produção acompanhou algumas expedições, mas só obtivemos bons registros quando alugamos uma lancha que conferiu uma melhor estabilidade na captação das imagens – como as fotos de Guilherme Reynaldo que compõem esta matéria.

 

O contexto da divulgação e popularização de uma onda perdida em alto mar como a Laje da Jagua, se encaixa dentro da premissa principal do roteiro do documentário, onde as diversas formas de ocupação do litoral ilustram a nossa relação com a memória e as paisagens do território em que habitamos, no entendimento de que as coisas só ganham significado quando atribuímos algum valor a elas.

 

A Pedra e o Farol estreou no dia 11 de agosto em Laguna (SC), e teve exibições abertas ao público nos dias 19 e 21 de agosto no Cinema do CIC em Florianópolis. Mais informações aqui