Água-viva

Biólogo explica ocorrência

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Adriano de Souza teve contato com água-viva e ficou com a pele bem irritada na Austrália há alguns anos. Foto: Guto Amorim.

Acredito ser importante esclarecer algumas notícias e informações que estão sendo divulgadas sobre os supostos “Ataques de águas-vivas”.
 
Em primeiro lugar, águas-vivas e caravelas não “atacam” as pessoas. São animais que vagam pelos mares ao sabor das correntes e ocasionalmente podem provocar acidentes quando os banhistas se aproximam e, inadvertidamente, chocam-se contra esses seres. Se pudessem, eles evitariam tal contato.
 
O verão é uma época natural de reprodução desses animais. Com esse objetivo, eles formam grandes agregações onde machos e fêmeas se encontram. Ocasionalmente, uma corrente marinha pode levar esses animais a se aproximarem mais do litoral e o aumento da interação com homem pode provocar um correspondente aumento no número de acidentes.
 

Está em moda hoje culpar o “Aquecimento Global” por alguns eventos da natureza, porém não há evidências científicas que comprovem tal relação, incluindo o suposto aumento nas ocorrências de águas-vivas e caravelas no litoral brasileiro.
 
A meu ver, o que está ocorrendo não é simplesmente um aumento no número de casos, mas sim um aumento considerável no número de relatos de casos de acidentes com esses seres marinhos. Como a imensa maioria dos casos no Brasil são brandos (a vítima trata do ferimento em casa), ainda que todos os verões ocorram centenas de acidentes, os mesmos não costumam ser relatados.

 

Agora, neste verão, que apenas está começando, mesmo que se possa considerar um aumento real no número de casos, o que seria absolutamente normal, as primeiras reportagens e relatos incentivaram novas reportagens e novos relatos, provocando um efeito em cascata retroalimentado pela mídia e pela extraordinária (e relativamente nova) propagação da informação pela internet.
 
A fim de esclarecer os fatos e transmitir informações corretas sobre esses animais e sobre como agir em caso de acidente, segue abaixo um texto tirado do meu livro Seres Marinhos Perigosos.
  
Celenterados
 
Pertencem ao filo Cnidaria, que reúne os animais mais inferiores com tecido e cavidade digestiva definidos. Este ramo abrange as classes Hydrozoa (hidróides, plumas-do-mar, falsos corais urticantes, medusas e caravelas), Scyphozoa (cifomedusas – ?águas-vivas?) e Anthozoa (anêmonas-do-mar e corais).

 

Os indivíduos podem ser solitários ou coloniais e apresentar duas formas em seu ciclo vital. O pólipo, com corpo tubular onde a extremidade inferior é fechada e fixa e a superior apresenta uma boca central circundada por tentáculos moles, e a medusa, com corpo gelatinoso em forma de guarda-chuva ou sino, marginado por tentáculos, boca na superfície côncava inferior e natação livre __ dependem, em grande parte, das correntes, ventos e marés para se locomover. No entanto, essas duas formas podem apresentar-se modificadas e, ambas, podem aparecer no ciclo reprodutivo de várias espécies.

 

O aparelho inoculador de peçonha é constituído de uma bateria de células denominadas nematocistos. Cada nematocisto consiste de uma diminuta cápsula arredondada, preenchida de líquido, contendo um fio tubular enrolado que pode ser projetado para fora. Embora possam ocorrer em quase toda a epiderme do animal, são mais abundantes nos tentáculos. Existem quatro tipos diferentes de nematocistos. Dois deles produzem uma substância pegajosa e são usados na locomoção e apreensão de alimentos, não apresentando perigo para o homem.

 

Os outros dois, chamados penetrante e envolvente, são usados em conjunto para capturar suas presas e apresentam um líquido peçonhento que pode provocar grande irritação (urticária) e intensa sensação de queimadura, além de ser um potente agente paralisante do sistema nervoso. Análises recentes revelaram, na peçonha, a presença de uma complexa mistura de toxinas (hipnotoxinas, neurotoxinas, cardiotoxinas e palytoxinas) e/ou enzimas antigênicas, como o hidróxido de tetra-metil-amônio, a serotonina, a histamina e outras substâncias ainda não definidas.

 

O tipo penetrante tem um longo tubo filiforme enrolado transversalmente. Na descarga, esse tubo explode para fora, disparando um microaguilhão que perfura a pele e inocula a peçonha. Essa descarga é extremamente rápida (ocorre em apenas 3 milisegundos) e possui grande velocidade, atingindo a inacreditável força de aceleração de 40 mil G, que capacita o microaguilão a penetrar até na carapaça de um caranguejo. O tipo envolvente contém um fio curto e espesso enrolado. Na descarga, ele se enrola fortemente em torno dos pêlos da pele. Ao coçarmos a pele, devido a ação da peçonha já inoculada pelo nematocisto penetrante, estouramos uma pequena bolsa que ele carrega e inoculamos involuntariamente ainda mais peçonha.

 

O sistema de descarga é ativado através de reações involuntárias (estímulos químicos ou físicos). Por isso, mesmo após a morte do animal, os nematocistos podem ser ativados.
 
Águas-vivas (Cifomedusas)

 

Possuem os sexos separados e sua geração polipóide é diminuta ou ausente. Apresentam o corpo gelatinoso, em forma de sino cúbico (cubomedusas) ou guarda-chuva (discomedusas), com pequenos tentáculos delicados e marginais. Sua boca, no centro da superfície côncava inferior, é circundada por tentáculos orais contendo numerosos nematocistos.

 

Vivem nos mares tropicais e subtropicais, nas águas pelágicas e costeiras. São comuns nas praias pelo fato de preferirem as águas com fundo arenoso e os estuários dos rios. Podem ocorrer isoladamente ou em grandes grupos __ principalmente nos ciclos sazonais de procriação, em áreas que são, em geral, conhecidas pelos habitantes locais e evitadas por motivos óbvios. Flutuam calmamente na superfície ou a meia-água, porém, nas horas mais quentes do dia, migram para as águas mais profundas. Apesar de poderem se deslocar por contrações rítmicas, estão, em grande parte, à mercê das correntes e ondas. Durante as tempestades e ressacas, um grande número delas costuma ser lançado nas praias.

 

Seu alimento, peixes e pequenos invertebrados, é capturado e paralisado pelos nematocistos dos tentáculos orais e conduzido para a boca. São exatamente esses tentáculos orais que provocam acidentes com o homem.

Todas as águas-vivas são capazes de infligir algum dano, porém apenas algumas espécies são realmente perigosas e podem provocar lesões muito dolorosas e sérias. Em nosso litoral, são mais comuns as discomedusas dos gêneros Aurelia e Chrysaora, que podem provocar urticária, pequenas lesões e dermatites dolorosas.

 

As mais perigosas, no entanto, capazes de infligir desde lesões moderadas (dor pulsátil ou latejante, porém raramente causando inconsciência) a lesões severas (dor intensa que pode levar à perda da consciência e ao afogamento), são as cubomedusas dos gêneros Carybdea e Chiropsalmus. Este último, pertence à ordem Chirodropidae, que abriga as águas-vivas consideradas as mais peçonhentas criaturas do planeta. Denominadas vulgarmente de vespas-do-mar, podem, em um processo rápido, provocar, além de erupções e dor lancinante, falência circulatória, paralisia respiratória e morte.

 

No Brasil, os acidentes mais graves são provocados pela Chiropsalmus quadrumanus. Os acidentes com a espécie Carybdea alata costumam ser menos perigosos. Apesar de não ocorrerem em nossa costa, e sim no Pacífico, vale citar dois outros gêneros muito perigosos e interessantes. As discomedusas do gênero Cyanea, que podem atingir mais de 2 metros de diâmetro, com tentáculos muitas vezes maiores do que 30 metros de comprimento, e as cubomedusas do gênero Chironex (vespa-do-mar), que são consideradas as águas-vivas mais mortais do mundo, as mais peçonhentas de todas as criaturas marinhas. São responsáveis por numerosas fatalidades na costa da Austrália __ a morte pode ocorrer em poucos minutos, decorrente dos colapsos circulatório e respiratório. Seu tamanho, entretanto, não costuma passar dos 20 centímetros de diâmetro, enquanto seus tentáculos alcançam no máximo 3 metros de comprimento (estima-se que um animal adulto possa ter cerca de 4 bilhões de nematocistos em seus tentáculos).

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Caravelas (Sifonóforos)

 

A caravela-portuguesa, como também é chamada, é uma colônia flutuante formada por pelo menos quatro pólipos polimórficos vivendo em perfeita simbiose. O pólipo flutuador ou pneumatóforo, que secreta gás para tornar a colônia flutuante, os pólipos nutritivos, que digerem o alimento, os pólipos reprodutores e os pólipos defensivos ou pescadores, que apresentam longos tentáculos com muitos nematocistos grandes e poderosos __ sua peçonha é antigênica, hemolítica, dermato-necrótica e potencialmente letal para o homem.

 

Na espécie do Atlântico, Physalia physalis, o flutuador, usado como uma verdadeira vela, possui coloração roxo-azulada, podendo atingir até 30 centímetros de comprimento e mudar seu formato por contrações. Seus inúmeros tentáculos, longos e transparentes, podem chegar a 32 metros de comprimento e conter até 80 mil nematocistos em cada metro.

 

A caravela é uma das mais temidas criaturas que se pode encontrar flutuando na superfície da água nos mares quentes. É, sem dúvida, a responsável pelo maior número e pelos mais graves acidentes com celenterados no Brasil. Sua maior incidência, em nosso litoral, ocorre no verão, quando podem atingir algumas praias em grande número. Apenas no verão de 1994, foram registrados cerca de trezentos acidentes com estes animais nos litorais de São Paulo e Rio de Janeiro. Destes, muitos necessitaram de atendimento médico e duas crianças tiveram parada respiratória (felizmente responderam bem às manobras de reanimação).

 

Seus tentáculos, que usualmente se aderem à vítima, são capazes de provocar sérias lesões __ grande irritação e intensa dor __ e ter uma ação neurotóxica que pode causar sintomas sistêmicos severos, como ansiedade, dor nas costas, câimbras, náuseas, vômitos, desmaios, convulsões, arritmias cardíacas e problemas respiratórios. Alguns destes acidentes podem ser fatais devido ao choque e conseqüente afogamento. A literatura médica tem registro de três mortes por acidente com caravela no Atlântico, na costa sul dos EUA.

 

Prevenção Geral

 

Sabe-se que algumas águas-vivas conseguem evitar objetos grandes e escuros quando têm oportunidade. Assim, nas áreas com ocorrência desses animais, é aconselhável nadar ou andar bem devagar dentro da água e vestir roupas escuras, para dar chance ao animal de afastar-se com antecedência.

As estatísticas australianas descrevem que o risco de acidente com as águas-vivas é sempre maior nas águas calmas e quentes (90%) e no período da tarde (69%). As partes do corpo mais atingidas, em ordem decrescente, são as pernas (77%), os braços (11%), o tronco (10%) e a cabeça (2%).

 

É importante lembrar que os tentáculos de algumas espécies podem atingir uma distância considerável do corpo do animal e, por isso, deve-se evitar sua aproximação. No entanto, no caso das águas-vivas, com seus corpos gelatinosos, é preciso ?olhos treinados? para localizá-las a tempo de evitar o contato. Roupas de neoprene, apropriadas para o mergulho, são úteis para evitar a inoculação da peçonha. Os trabalhadores de águas tropicais devem estar adequadamente vestidos para evitá-las.

Mesmo aparentemente mortas e jogadas em uma praia, os tentáculos das águas-vivas e caravelas podem grudar na pele e infligir graves lesões, visto que os nematocistos são descarregados por reações involuntárias. Após as tempestades e ressacas, um nadador pode sofrer sérias lesões ao entrar em contato com tentáculos soltos que ficam boiando na água. Por isso, deve-se, após esses eventos, evitar a natação em locais habitados pelas águas-vivas e caravelas. Cobrir o corpo com óleo mineral, ou similar, pode apenas ajudar a evitar que os tentáculos grudem na pele.

 

Na remoção dos tentáculos grudados na vítima, nunca use as mãos desprotegidas. Nematocistos ainda carregados podem inocular a peçonha nas mãos do socorrista e torná-lo outra vítima.
   
Aspectos Médicos dos Celenterados

 

Os sintomas clínicos e as severidades produzidos pelos acidentes com os celenterados estão diretamente relacionados a duas composições variáveis de fatores:
 
1 – Relativas ao homem __  dependerá da capacidade do nematocisto de penetrar na pele humana __ local do corpo atingido (espessura da pele e quantidade de pelos que a protegem) __, extensão da área do corpo comprometida e da sensibilidade, estado de saúde e tamanho corporal da vítima (quanto menor o peso, maior a concentração de peçonha no organismo).

 

2 – Relativas ao animal __  as propriedades peçonhentas de um celenterado dependem não somente da espécie envolvida e, conseqüentemente, da composição química (toxinas) de sua peçonha, mas, principalmente, de uma série de fatores que irão influenciar na quantidade de peçonha inoculada durante o contato com a vítima. Destes fatores fazem parte o número, tamanho e largura dos tentáculos envolvidos, o tempo em que a pele é exposta ao contato e a quantidade de nematocistos aptos a descarregar a peçonha, o que dependerá do espaço de tempo desde a última refeição do animal (nematocistos já descarregados na presa e não repostos). Além disso, fatores ambientais como a salinidade e a quantidade de comida disponível no ambiente e, ainda, o estado fisiológico do animal, podem influenciar na quantidade e potência da peçonha inoculada.

 

Os sintomas produzidos pelas águas-vivas e caravelas variam bastante. Algumas produzem lesões leves, enquanto outras são capazes de causar muita dor local e sintomas generalizados que podem até levar à morte em poucos minutos. Os sintomas mais freqüentes, que são as manifestações locais, variam de uma suave irritação ou ardência a queimaduras com dor pulsátil ou latejante que pode durar de 30 minutos a 24 horas e deixar a vítima inconsciente. Em alguns casos, a dor é restrita à área do contato, porém, em outros, pode irradiar-se para a virilha, abdome ou axila. A área que entra em contato com os tentátulos geralmente torna-se hiperemiada, podendo ocorrer placas urticariformes lineares, erupção inflamatória, flictena, edema, pequenas hemorragias na pele e até mesmo necrose. Nos acidentes leves, as lesões urticariformes costumam regredir passadas cerca de 24 horas, deixando lesões eritematosas lineares que podem persistir no local por meses.

 

Nos casos mais graves, onde ocorrem as manifestações sistêmicas, podemos ter cefaléia, mal-estar, náuseas, vômitos, câimbras, rigidez abdominal, diminuição da sensação de temperatura e toque, dor lombar severa, espasmos musculares, perda da fala, sialorréia, sensação de constrição na garganta, dificuldade respiratória, arritmias cardíacas, paralisia, delírio e convulsão. A morte pode ocorrer por efeito da intoxicação, que gera insuficiência respiratória e choque, ou por anafilaxia (reação inflamatória aguda de origem alérgica).

A inoculação de peçonha pelas águas-vivas da ordem Chirodropidae (cubomedusas chamadas vespas-do-mar) está entre os eventos médicos mais dramáticos e constitue-se em um dos mais rápidos processos de intoxicação que se conhece.

 

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Tratamento Geral

 

Há muita controvérsia, especulações e opiniões conflitantes com relação aos procedimentos nos primeiros socorros e no tratamento das lesões provocadas pelos celenterados.

Quanto aos primeiros socorros, deve-se atentar para os seguintes aspectos progressivos a serem considerados:
 
1 – O contato inicial com os tentáculos resultam primeiramente em uma modesta inoculação pelos nematocistos.

 

2 – Quanto mais tempo o tentáculo permanecer em contato com a pele, mais nematocistos poderão ser descarregados, já que as descargas são contínuas.

3 – Uma substancial quantidade de pedaços de tentáculo são arrancados do animal e grudam na vítima quando a mesma entra em pânico e se debate próximo ao animal.

 

4 – Os esforços subseqüentes da vítima, ainda dentro da água, para desvencilhar-se dos pedaços de tentáculo aderidos, costumam resultar em um considerável aumento nas descargas dos nematocistos.

 

Trata-se de uma situação realmente difícil, onde a questão ?deve-se ou não tentar remover os tentáculos ainda dentro da água?? é levantada com freqüência. No entanto, observações e estudos dos acidentes têm resultado em recomendações com maiores possibilidades de sucesso.

 

Assim, ao ser inoculada, a vítima deve esforçar-se ao máximo para manter-se calma e conseguir sair da água o mais rápido possível, devido ao risco de choque e afogamento, sem, porém, tentar remover com as próprias mãos os tentáculos aderidos. Somente após chegar em terra firme é que haverá a necessidade da remoção cuidadosa dos tentáculos aderidos à pele, sem esfregar a região atingida, o que só pioraria a situação.

Com relação às substâncias efetivas e capazes de desativar as descargas dos nematocistos e/ou diminuir a ação da peçonha, existem muitas opiniões conflitantes. Enquanto algumas são totalmente inócuas e outras podem até mesmo aumentar a inoculação e, conseqüentemente, a lesão, existem aquelas com comprovada eficácia.

Soluções alcoólicas metiladas como os perfumes, loções pós-barba ou mesmo bebidas alcoólicas (etanol) não devem ser utilizadas, pois em alguns casos podem induzir mais descargas e/ou prolongar a agonia da vítima. Em contrapartida, o hidróxido de amônia diluído a 20%, o bicarbonato de sódio diluído a 50% e o soro do mamão papaia (antiga técnica usada pelos nativos havaianos), além de outros tipos de medicamentos, têm sido usados com variado grau de sucesso para reduzir a ação da peçonha e desativar os nematocistos dos tentáculos que ainda permanecem grudados no local lesionado. Existem relatos não científicos de que a urina também teria efeito sobre a peçonha. Como não há comprovação médica, seu uso é desaconselhável.

Sobre a utilização do vinagre (ácido acético de 4 a 6%), usado largamente como inativador dos nematocistos, alguns estudos assinalam que o mesmo não tem ação anti-álgica e é efetivo somente para a desativação das descargas posteriores dos nematocistos de apenas algumas espécies, podendo provocar efeito contrário em outras.

 

Alguns autores demonstram que o resfriamento do local da lesão, através da aplicação de bolsas de gelo logo após o acidente, reduz sensivelmente a dor local, contrariando conceitos emitidos por outros autores que contra-indicam este procedimento.

Desde 1970, a Commonwealth Serum Laboratories vem pesquisando com sucesso um tipo de antídoto desenvolvido a partir da peçonha da água-viva Chironex fleckeri, já tendo conseguido neutralizar em poucos minutos os efeitos locais e sistêmicos em vários banhistas atingidos por esta espécie nas praias da Austrália.

Apesar de toda essa discussão, existem procedimentos, com comprovada segurança, que devem ser seguidos. Os primeiros socorros e o tratamento têm quatro objetivos principais:

 

1. Minimizar o número de descargas dos nematocistos na pele.

2. Diminuir os efeitos da peçonha inoculada.

3. Aliviar a dor.

4. Controlar sua repercussão sistêmica.

 

A dor é, em geral, controlada através do tratamento da dermatite. Ainda assim, pode-se utilizar analgésicos simples (Novalgina ou Tylenol) nos casos brandos e a morfina quando a dor é mais intensa. Os anti-histamínicos e corticóides orais ou tópicos são úteis para o tratamento das reações inflamatórias do tipo alérgica.

É importante observar e estar atento para a vítima que é resgatada da água com euforia e grande atividade física e que, de repente, torna-se calma e cooperativa. Esta mudança brusca de comportamento pode significar uma séria manifestação de disfunção do Sistema Nervoso Central (choque neurogênico) advinda do aumento nos níveis de intoxicação sistêmica. A necessidade de reanimação cárdio-pulmonar, nesses casos, pode ser iminente. A assistência ventilatória e outras medidas de suporte hemodinâmico utilizadas em terapia intensiva podem ser necessárias nos casos mais graves e complicados, que poderão também requerer o mesmo tratamento aplicado para as grandes queimaduras por fogo.

 

A rotina de tratamento para uma vítima de acidente com os celenterados deve seguir os seguintes passos:

n A primeira medida é lavar abundantemente a região atingida com a própria água do mar para remover ao máximo os tentáculos aderidos à pele. Não utilize água doce, pois ela poderá estimular quimicamente (por osmose) os nematocistos que ainda não descarregaram sua peçonha.

 

Não tente, de modo algum, remover os tentáculos aderidos com técnicas abrasivas, como esfregar toalha, areia ou algas na região atingida.

 

Para prevenir novas inoculações __ ao desativar os nematocistos ainda íntegros e também neutralizar a ação da peçonha __, banhe a região com ácido acético a 5% (vinagre) por cerca de 10 minutos (as soluções de sulfato de alumínio ou amônia, ambas diluídas a 20%, são alternativas para a falta do vinagre). É importante lembrar que o vinagre não possui nenhuma ação benéfica sobre a dor já instalada pela inoculação inicial.

 

Remova suavemente os restos maiores dos tentáculos aderidos com a mão enluvada e com o auxílio de uma pinça. Para retirar os fragmentos menores e invisíveis tricotomize o local com um barbeador ou com uma lâmina afiada. Pode-se aplicar antes um pouco de espuma de barbear em spray, lembrando-se de não esfregar a região.

 

Lave mais uma vez o local com água do mar e reaplique novos banhos de ácido acético a 5% (vinagre) por 30 minutos.

 

Para remover os nematocistos remanescentes pode-se aplicar no local uma pasta de bicarbonato de sódio, talco simples e água do mar. Espere a pasta secar e a retire com o bordo de uma faca.

 

Caso a dor continue, use compressas geladas no local e substâncias analgésicas sistêmicas para reduzir os sintomas álgicos.

 

Havendo reação alérgica/inflamatória, aplique uma camada fina de loção do corticóide betametazona (Betnovat) duas a três vezes ao dia. Nos casos mais graves, utilize anti-histamínicos ou corticóides orais __ consulte sempre um médico para orientação.

 

Em caso de infecção secundária, será necessário o uso de antibióticos com amplo espectro, tópico (bacitracina ou neomicina) ou sistêmico (ampicilina + acido clavulânico), de acordo com a gravidade __ consulte sempre um médico para orientação.