Bom de Bico

A nova era dos pranchões

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Recém-fundada, a ABL (Associação Brasileira de Longboard) organizou no último mês de julho, três campeonatos que marcaram não somente a abertura do circuito brasileiro, mas uma nova era no longboard nacional.

 

Além do Pena Bahia International Longboard Classic, do Pena Pernambuco International Longboard Classic e do Petrobras Longboard Classic, o circuito de 2011 conta com mais três etapas confirmadas e com previsão de pelo menos outras três até o final do ano. Uma prova do potencial da modalidade, que nunca teve a devida atenção das entidades que comandam o surf no Brasil.

 

A primeira tentativa de vender o projeto de um circuito sólido de longboard surpreendeu os mais otimistas. Até o ano passado, dependíamos dos dois eventos anuais da Petrobras para compor o circuito, que contava, geralmente, com mais uma etapa. Agora a realidade é bastante diferente.

 

Com muito mais etapas e premiações até duas vezes maiores do que os principais campeonatos do ano passado ofereciam, o calendário está atraente. 

 

Pena Bahia International Longboard Classic Apesar do caráter internacional, o evento contou pontos apenas para o circuito brasileiro, pois as taxas de homologação da ASP ainda são consideradas altas pela ABL.

 

Foi a etapa de abertura do circuito nacional, com premiação recorde de R$ 52.500 mil. A paradisíaca Itacimirim (BA), recebeu a caravana do longboard e as baterias foram eletrizantes. 

 

Nos treinos, Jonas Lima e Rodrigo Sphaier chamaram atenção. Mas quando as baterias foram para a água, destaque para Adriano Lima, que venceu Halley Batista de forma surpreendente, ao sair de uma combinação com muita categoria.

 

Outro que chamou atenção foi Wenderson Biludo, garoto de Camburi (SP), que finalizou num excelente quinto lugar e está prestes a estrear no pódio das competições profissionais.

 

Marcelo Freitas foi campeão com méritos. Ganhou do Danilo Mulinha numa final muito equilibrada, com boas ondas surfadas. Para isso, passou por nomes de peso: Sphaier, Picuruta, Biludo e André Luiz Deca foram suas vítimas.

 

Entre os amadores, Felipe Lacerda, Paulo Giagueti, Rogério Vasconcelos e Adolfo Jordão venceram suas respectivas categorias com grandes atuações e notas altas.

 

A paranaense Fernanda Daichtman faturou a Feminino, depois de uma atitude anti-desportiva da baiana Aline Chaves nos segundos finais. As câmeras de vídeo flagraram uma puxada de cordinha e a baiana foi punida com interferência, dando adeus ao caneco e aos R$ 2.800 mil destinados à campeã.

 

Pena Pernambuco International Longboard Classic Quatro dias depois do evento baiano, a praia do Cupe, Porto de Galinhas (PE), recebeu a caravana dos pranchões para a disputa dos R$ 30 mil em prêmios.

 

Depois do Petrobras Longboard Classic, o evento de Pernambuco é o mais tradicional do calendário do longboard brasileiro. Sua primeira edição rolou em 2004. 

 

Quem chamou atenção foi o local Reginaldo Nascimento, que garantiu a terceira colocação no pódio, ao vencer uma disputa emocionante com o conterrâneo Halley Batista. Os noseridings do carioca Roger Barros impressionaram, mas os juízes não acharam suficientes para levá-lo à final.

 

Na grande final, Danilo Mulinha soltou potentes coices para vencer o gigante Phil Rajzman. Foi um show de surf moderno, com a linha progressiva bem explorada pelos dois.

 

Manobras potentes e muita experiência na água foram os ingredientes da bateria, fazendo uma reedição do mundial da França em 2007 – quando Phil foi campeão do mundo e o Mula vice – provando o alto nível do longboard nacional.

 

Atalanta Batista venceu na Feminino, com a bicampeã Mainá Tompson em segundo. Mainá, que vem retomando o melhor ritmo depois da gravidez e promete voltar a brigar por títulos, fez discurso emocionado no pódio, mostrando que é uma longboarder de verdade, com grande sentimento de luta, sem ultrapassar o amor ao esporte e o respeito às outras competidoras.

 

Vale destacar, as meninas evoluíram bastante sobre o entendimento do que é surf de longboard. Atalanta, Thiara Mandelli e Fernanda Daichtman vêm mostrando um estilo apropriado para o surf de pranchão, com postura adequada, passadas bem executadas e noseridings verdadeiros, daqueles que os dedos ficam realmente pendurados pra fora do bico e não a 30 centímetros dele.

 

Entre os amadores, Rogério Vasconcelos e Adolfo Jordão repetiram suas vitórias da etapa baiana. O paraibano Thiago Lucas surpreendeu os favoritos e venceu na Júnior, enquanto Adriano Lima ganhou a Adulto.

 

Petrobras Longboard Classic O tradicional torneio completa uma década, com dois eventos anuais. Durante os últimos dez anos, foi responsável por salvar o circuito brasileiro de longboard e é responsável direto pela modalidade ter chegado ao patamar que está.

 

Nesta década de campeonatos, famílias foram formadas, vários títulos definidos, legends valorizados, talentos descobertos e muita onda boa surfada.

 

Os eventos ajudaram a converter o Brasil numa potencia do longboard mundial, mas precisam se enquadrar no atual contexto da modalidade, para não transformarem-se em etapas complementares do circuito. O que dá peso num campeonato é a premiação oferecida, e neste quesito, pelo menos por enquanto, estão ficando para trás.

 

Se não seguirem a evolução que a ABL está propondo, correm o risco de tornarem-se descartes na somatória de pontos dos atletas, uma vez que a pontuação é definida pelo valor da premiação.

 

Os R$ 20 mil oferecidos na etapa de Ipitanga, Lauro de Freitas (BA), são os mesmos do primeiro campeonato em 2002. Apesar disso, o Petrobras Longboard Classic continua a etapa mais glamorosa do tour. É tudo muito bem montado e bonito, com os campeões brasileiros estampando as tendas principais, apesar de não poderem usá-las. 

 

A área reservada aos competidores, que deveria ser a principal e com melhor infra-estrutura, acabou ficando de fora do cercado do evento. Fomos colocados numa cobertura (que não era mal) de um quiosque localizado ao lado da estrutura. O problema era a música alta do quiosque, que misturava-se com o fraco sistema de som do evento e impossibilitava os atletas de escutarem a locução. 

 

Rogério Vasconcelos chamou atenção por dar uma canseira em Danilo Mulinha, líder do ranking. RV estava bastante focado, com pegada e técnica apurada. Se passasse aquela bateria, seria difícil pará-lo. O maior destaque da etapa foi a bateria entre Phil Rajzman e Rodrigo Sphaier, nas quartas-de-final.

 

Apesar das boas ondas surfadas pelos dois, Phil levou a melhor surfando apenas na rabeta, enquanto Sphaier fez uma linha mais completa, incluindo noseridings estilosos, muito bem mesclados às manobras radicais. 

 

Tecnicamente foi o ponto alto do evento, que rolou em condições difíceis, com vento forte e  incessantemente nos três dias. Vale destacar também, as performances de Roger Barros, com bicos monstruosos, mas não tão valorizados pelos juízes. Uma amostra que o surf de pancadas leva vantagem atualmente, apesar de ser uma competição de longboard. 

 

Assim como as semifinais, a final foi morna, prejudicada pelo mar ruim. Jeferson Silva chegou bem na decisão, mas o dia era do guerreiro Carlos Bahia, que voltou a vencer depois de longo período longe do lugar mais alto do pódio. Caiu em algumas finalizações, porém foi mais dinâmico e soube usar a experiência para liderar a disputa do começo ao fim. 

 

O Feminino não ofereceu premiação em dinheiro e por isso não teve a presença das melhores competidoras, com exceção de Atalanta Batista. A campeã foi a baiana Carla Circenes. Entre os Super Masters, o guarujaense Mauro Raposo venceu pela primeira vez no circuito e acendeu uma rivalidade com o carioca Adolfo Jordão pela ponta do ranking. Maurão incorporou a essência da modalidade, arriscou manobras tradicionais e conquistou uma vitória incontestável.

 

Fora d’água, o ponto alto do evento foi a homenagem feita ao campeão brasileiro de 1998, Olimpio Batista, o carismático Olimpinho, falecido em 2006 no Rio de Janeiro. 

 

O uso do recurso de vídeo (replay) nos campeonatos da Pena fez toda a diferença para o julgamento, acabando de vez com as dúvidas e diminuindo a subjetividade. Apesar de ainda faltar um entendimento prático dos juízes sobre o grau de dificuldade de algumas manobras, nunca o trabalho deles foi tão elogiado. 

A recusa dos organizadores do Petrobras Longboard Classic em utilizarem o replay, desagradou atletas, comissão técnica e ABL.

 

As etapas anteriores tiveram julgamento tranquilo, aprovado pela maioria, graças a ferramenta que custa apenas R$ 300 por dia, totalizando míseros R$ 900  a mais no custo geral do campeonato. O resultado por não usarem tal recurso, causou enorme insatisfação com o julgamento. 

 

Como o livro de regras da ABL ainda está sendo elaborado, não havia nada que obrigasse a utilização do replay. Por enquanto, o livro da Abrasp vem sendo usado, conforme avisado antes. Com o fechamento do livro de regras previsto para acontecer antes da próxima etapa, os longboarders podem ficar tranqüilos. Foi o último evento sem o uso de replay. Recurso simples e barato, que vai determinar evolução fundamental nos campeonatos de longboard.

 

A grande jogada da ABL é cortar taxas e custos abusivos, direcionando o dinheiro para a premiação. A diretoria pretende um trabalho limpo, priorizando os atletas, os verdadeiros donos do espetáculo. Seria interessante se todos trabalhassem com a mesmo filosofia, para fortalecer ainda mais o circuito brasileiro e valorizar a nova realidade do longboard nacional.

 

O Festival Ecovias, quarta etapa do circuito, acontece na primeira semana de setembro em Santos (SP).