Surfista normal, haole circunstancial

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No Hawaii, todo cuidado é pouco para evitar ser um haole-mané. Foto: Juninho.
A dura realidade é que em algum momento da sua vida de surfista você se tornará um haole. Simplesmente porque é impossível se envolver com o surf e não sair por aí em busca da onda perfeita.

 

Nessa estrada sem fim, um dia você vai chegar naquela praia de ondas maravilhosas pela primeira vez. Ao remar para o pico você não estará apenas realizando seus sonhos. Você também estará se transformando num haole.


Não esquente a cabeça nem sinta-se ofendido. Esse problema tem solução. Ser haole não é ser obrigatoriamente mané. O surfista que conhece suas habilidades e limitações e sabe se comportar com respeito na água pode surfar muitos picos diferentes por aí afora sem ser importunado.


Infelizmente muitos haoles não conhecem os princípios éticos e morais da vida em comunidade e do surf no crowd. Para piorar a situação nos mares do mundo, muitos locais também ignoram ou deliberadamente fingem ignorar essas regras de boa convivência.

 

O cara que se acha local, grita com todo mundo e ameaça quem não é da área não é melhor do que o surfista que chega num pico onde não conhece ninguém e rema em todas as ondas da série. São ambos bobocas.


Haole é palavra de origem havaiana que significa homem branco. No Brasil, chamar alguém de haole é feio. Esse emprego da expressão é relativamente recente por aqui. Coisa dos anos 80. Antes dessa época não havia surfistas que pudessem se dizer locais na maioria dos picos nacionais hoje dominados pelo crowd.


Lembro bem, parece que foi ontem, do tempo em que não havia no Rio de Janeiro sequer um surfista que pudesse se dizer local da Prainha, hoje uma das ondas mais famosas e cobiçadas do Brasil.


Você não é do Rio e quer surfar na Prainha? Você tem esse direito. Você tem direito de surfar qualquer onda do mundo. Mas se você se comportar mal tenha a certeza que os muitos locais da Prainha vão fazer esse seu direito se evaporar completamente. Essa é a sina dos haole-manés.


Depois de rodar muito por aí, posso afirmar que só conheço uma maneira de chegar bem num pico novo: respeitando os locais. Eles são parte da realidade e não adianta desejar que eles não existissem. Pense que esses caras devotam seus dias àquela onda, sabem mais sobre ela do que qualquer recém-chegado. É justo que tenham algum tipo de prerrogativa no mar. Se você chegou agora, vá com calma.


Não quero defender que nós, haoles circunstanciais, devamos nos comportar como freiras. Seria ingenuidade minha. Há situações extremas no surf que exigem atitude de batalha. Nenhuma freira surfista pegaria uma onda da série num dia bom em, por exemplo, Pipeline. Pegar uma onda boa, da série, em Pipeline, requer muita malícia e talvez um pouco de maldade.


Se todos temos nossos dias de haole, só nos resta utilizar a inteligência e o bom senso para diminuir os dissabores dessa situação delicada. Com habilidade, paciência, perseverança e, acima de tudo, respeito, talvez você nunca venha a ser considerado um haole-mané. Já é um bom começo para um surf saudável e feliz.