Museu do Surfe de Santos

O Mar Raivoso de Greg Noll

Dono de façanhas lendárias, Greg Noll abriu caminho para uma geração de surfistas nas décadas de 50 e 60.

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Greg Noll prestes a encarar Pipeline gigante com sua icônica bermuda listrada.

Foi com uma prancha madeira de balsa de 15 dólares que Greg Noll começou a surfar. O surfista das ondas grandes nasceu em San Diego, no dia 11 de fevereiro de 1937, mas viveu a infância e a adolescência em Manhattan Beach, na Califórnia, quando sua vida mudou. Noll conheceu Dale Velzy e aprendeu a fazer pranchas. Na costa sul, Noll passou a desafiar as ondas de Palos Verdes, em Lunada Bay.

Cartaz do filme Mar Raivoso, que causou um verdadeiro alvoroço no Brasil.

Em 1954 ele foi para o Havaí terminar os estudos. No lado norte da ilha de Oahu, Noll ficou conhecido por suas façanhas. Ele surfou ondas de 25 a 30 pés na Baía de Waimea, numa época em que esse feito era considerado impossível até para os havaianos locais.

Ele foi o primeiro surfista a surfar nas águas rasas do recife de Banzai Pipeline, em novembro de 1964. Nesse mesmo ano ele participou do filme Mar Raivoso como dublê das cenas de surfe e ficou muito popular.

Na década de 1960, a exibição do filme no Brasil causou um verdadeiro alvoroço. Antônio Campos, dono dos Cinemas de Santos, promoveu uma sessão especial no Cine Insaiá, e seu filho Toninho tratou de juntar a galera do Canal 3, entre eles os irmãos Ucho, Mané e Paulo Carvalho, Gino Sarti, Dani Machado, Petito Batendieri, Marcelo Guimarães, Miguel Sealy, Bruce Abrantes, Frigerio, Lacraia, Nando Gouveia, Walter Theodosio, entre outros.

Do outro lado da cidade, Dudu Argento e seus amigos saíram do Itararé para assistir ao filme Mar Raivoso na Pedro Lessa, em Santos. O Cine Brasília exibia a história daquele grupo de jovens universitários norte-americanos que passavam as férias no Havaí, curtindo muito rock’n’roll, praias paradisíacas, ondas enormes e lindas garotas. A turma do Itararé sacou logo a magia do mundo do surfe.

Outros cinemas da cidade também fizeram história. Foi o segundo cartaz do recém-inaugurado Cine Glória no edifício que leva o mesmo nome. Já o Cine Marapé na avenida Pinheiro Machado atraiu a tribo de surfistas da rua Maranhão, no Canal 1, entre eles os irmãos Álvaro de Souza e José Manoel.

Também conhecido como “Da Bull”, Noll foi um dos primeiros desbravadores do North Shore de Oahu.Arquivo Waves
Também conhecido como “Da Bull”, Noll foi um dos primeiros desbravadores do North Shore de Oahu.

No Guarujá até o cartaz do filme foi disputado. Na Ilha de Santo Amaro, reduto dos surfistas Ruy Gonzalez, Silvinho Daige, Udo, Ronaldo Pardal, Eduardo Nogueira (Piolho), o filme Mar Raivoso passou no Praiano Palace e atraiu uma multidão de jovens ávidos pelas ondas grandes.

No Rio de Janeiro não foi diferente. Os surfistas do Arpoador, entre eles Marcelo Rabello, José Carlos Brant (Piuí), Mario Brant (Bração), Rafael Gonzalez (Rato), Mudinho e Rico de Souza, se reuniram no Cine Miramar, no Leblon. Uma exibição marcante pra galera pioneira do surfe carioca.

Independente da cidade, do estado e do país, o filme Mar Raivoso marcou uma geração. Pela primeira vez as big waves de Waimea, no Havaí, deixavam as imagens estáticas das revistas pra ganhar o tamanho, volume, som e a forma do cinema. A sétima arte reproduziu além das ondas, o espírito do surfe, a surf trip e o estilo de praia.

Nesta época, o destemido surfista Greg Noll, também conhecido como Da Bull, foi o primeiro a estabelecer uma marca registrada: uma bermuda com listras horizontais nas cores branca e preta. A icônica bermuda precisou ser adotada pelo ator James Mitchum, ao contrário dos outros dublês de surfistas que recebiam os calções de banho combinando com as estrelas do cinema. Foi um caso raro de pop star se dobrando para um dublê.

Em dezembro de 1969, em Makaha, Greg Noll se consagrou como big rider. Ele encarou o mar em condições inimagináveis e surfou o que muitos na época acreditaram ser a maior onda já surfada. Ele e outros surfistas como Pat Curren, Mike Stange, Buzzy Trent, George Downing, Mickey Munoz , Wally Froyseth, Fred Van Dyke, José Angel e Peter Cole são vistos como os surfistas mais ousados ​​de sua geração.

Lenda viva do surfe em visita a Santos, no dia 5 de julho de 2010.Arquivo Waves
Lenda viva do surfe em visita a Santos, no dia 5 de julho de 2010.

A lenda viva do surfe mundial visitou Santos, litoral de São Paulo, no dia 5 de julho de 2010. Ele foi recebido no Parque Roberto Mario Santini, onde está situado o Museu do Surfe de Santos, e diversas personalidades do surfe santista lhe prestaram homenagens.

Na ocasião, Picuruta Salazar, representando a Associação Santos de Surf, entregou-lhe um prato comemorativo com o título de “Herói do Surf Mundial”. Os Pioneiros Surf Club do Litoral Paulista, José Luiz Sant’Anna e Carlos de Alencastro, o Lobinho, presentearam o surfista com um troféu e um quadro. Noll ainda ganhou dos membros do grupo um quadro do artista plástico Marcos Loyo e uma bermuda exclusiva do clube, inspirada no clássico modelo listrado.

O lendário surfista completou no último dia 11 de fevereiro, 84 anos de vida. O legado de Greg segue vivo com ele: “Éramos eu, minha prancha, parafina e bermuda. Era tudo o que precisava. Pra fazer qualquer outra coisa no mundo, você precisa disso, daquilo, sempre precisa de alguma coisa. Quando você vai surfar, tudo que precisa é de uma prancha, uma parafina e uma bermuda”.

E foi assim, com uma bermuda, uma prancha e parafina, que Greg Noll e um grupo de surfistas desbravaram o lugar que se tornaria a meca do surfe. Com uma coragem única, Noll abriu caminho para uma geração de surfistas nas décadas de 1950 e 1960, no North Shore de Oahu, em picos como Waimea, Pipeline e Makaha.