Uma coisa leva a outra...

Pranchas que definem estilo

Edinho Leite discute como conceitos de shape podem mudar o estilo de toda uma geração.

0
Gerry Lopez transformou o raio da Lightning Bolt em sinônimo de fluidez e estilo. Maravilhoso surfe em Pipe, copiado até no Brasil, onde as ondas não eram as mesmas.

A criatividade e habilidade desenvolvidas nas ondas pedem mudanças nas pranchas e isso acaba redefinindo o estilo, muitas vezes, de toda uma geração. Sempre foi assim.

Quer um exemplo? Com a largura das pranchas modernas mais à frente, muita gente passou a pisar mais para o bico da prancha para acelerar e, claro, voar. Isso teve influência direta no estilo de quem começou a surfar quando o esporte passou a dominar o espaço aéreo. Definindo estilo como a maneira que cada um se posiciona sobre a prancha e usa seu corpo para controlar a mesma nas ondas.

Spider Murphy fez o que Shaun Tomson queria para o Havaí. Tentando copiar Dick Brewer, exagerou no rocker e, no fim das contas, revolucionou o surfe em Pipe, especialmente de backside.

Uma questão de “uma coisa leva a outra”. Surfistas começam a redefinir um tipo de manobra, de maneira de atacar as ondas e, pronto, as pranchas precisam ajudá-los a realizar esses movimentos. Na sequência, até quem não queria, acaba tendo que se adaptar à nova tendência nas ondas, a não ser que se mantenha com o tipo de shape que sempre usou.

Olhando para o micro universo à minha frente (Baixada Santista), pude ver que, nos anos 1970, nas Pitangueiras, a turma dali já podia viajar para fora, trazendo de lá (Califa e Havaí, principalmente) pranchas enormes, acima de 7’0, e informações que, nem sempre, eram condizentes com as ondas daqui. Ok, desenvolveram um estilo mais ereto, limpo e de linhas longas, com os pés juntos. Todo mundo tentava posicionar os braços como o Gerry Lopez.

O tetracampeão mundial (1979 a 1982) Mark Richards e suas twin fins redefiniram a linha de surfe da geração que se seguiu.

Já na praia do Tombo, logo ao lado, assim como nas adjacências, a turma vinda de Santos e os locais não tinham nem informação nem pranchas gringas. Resultado, foram adequando seus shapes às ondas disponíveis. Faziam um surfe onde importava mais a radicalidade advinda de sua criatividade, usando pranchas menores. Picuruta Salazar e Paulo Rabello são exemplos da eficiência que isso gerou, ao serem os primeiros paulistas a se darem bem nos eventos antes dominados pelos cariocas.

O interessante é que, até hoje, consigo enxergar as diferenças entre os estilos da galera de uma praia e outra. Mesmo numa época de surfe tão padronizado ainda há reflexos de um passado não muito distante.

A Plastic Machine, de Bob McTavish, surfada por Nat Young em 67, marcou a revolução das shortboards. Linhas antes inimagináveis agora eram possíveis e a cintura passou a fazer parte da dança. “Pranchas horríveis com quilhas gigantes, mas fazíamos funcionar porque era tudo que tínhamos.” (McTavish).

Certa vez, viajando na companhia de um legend do surfe californiano, Gene Harris, ele me contou que houve uma época em que o bacana era mudar a direção da prancha, o mais rápido possível, mas sem espirrar água, sem fazer aquele baita leque que tanto nos agrada hoje. As coisas mudam, com elas as pranchas.

Isso tudo é apenas uma constatação. Não vai aqui o desejo de definir melhor, pior, certo ou errado. Deixo só a dica quanto à escolha do seu equipamento ou a variedade que você pretende implantar num quiver. Cada um faz o que quer, contanto que se divirta. Porém, tenha em mente que cada prancha se presta melhor a um tipo de surfe, um estilo de surfar e às ondas que favorecem isso tudo.