Adilson Chumbinho

Resgate de um ícone

Grande nome do bodyboard no início dos anos 1990, Adilson “Chumbinho” Junior relembra os momentos marcantes da carreira.

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Chumbinho em ação nos tubos de Paúba.Fabricio Alabarce
Chumbinho em ação nos tubos de Paúba.

Nascido em março de 1974, no Guarujá (SP), Adilson “Chumbinho” Junior foi um dos melhores bodyboarders que o Brasil já teve.

Ele deu os primeiros passos no esporte em meados dos anos 1980, ainda na febre do “Morey Boogie”. Um dos atletas mais completos de sua geração, Chumbinho se tornou uma máquina de competição e títulos.

Hoje, aos 44 anos, ele relembra um pouco sobre sua trajetória e os momentos marcantes de sua carreira na entrevista abaixo.

Quando e como foi seu primeiro contato com o bodyboard?

Foi no final de 1986. Vi uma amiga com uma prancha de bodyboard e pedi uma para minha mãe no Natal. Ela me deu uma Mach7-7 de presente.

Quem foram suas principais referências e seus primeiros ídolos no esporte?

No começo ficava olhando a galera mais antiga de São Paulo, como o Roberto Testinha e o Bruno Cristófaro. Mas aí uma galera mais nova começou a surfar e ficava tentando colher informações em revistas e filmes para ir aprendendo.

No ano seguinte, tivemos alguns eventos de nível nacional. Era sentar na praia e ficar o dia todo assistindo os atletas profissionais como Cláudio Marques, Xandinho, Kiko Pacheco, Paulo Esteves. Meu primeiro ídolo foi o Mike Stewart e depois que comecei a seguir o circuito brasileiro, tiveram vários atletas: Paulo Esteves, Fabio Aquino, Guilherme Tâmega, dentre outros.

E como foram suas primeiras competições e quando surgiram os primeiros patrocinadores?

O primeiro campeonato foi na praia de Pernambuco. Um campeonato pequeno, com 16 atletas, e eu ganhei a categoria amadora. Minha primeira grande competição foi o festival Phillipines, em 1987, ficando em 5º na mirim. Aí começaram a surgir alguns apoios e patrocinadores.

Depois, veio o circuito paulista em 87, que terminei o ranking geral Masculino em 4º lugar, sendo o destaque do circuito devido a idade (13 anos), onde competia com atletas bem mais velhos, e também, de outros Estados.

E as primeiras competições fora de São Paulo? Quais foram e como se saiu?

Em 1988, fui a primeira vez para o Rio, assistir as finais do OP pro no Quebra-Mar e depois fui competir o Bliss. Perdi na segunda fase. Neste mesmo ano, competi o circuito paulista e fui campeão. Competi também a etapa do brasileiro em São Paulo.

Durante os anos dourados do bodyboard na década de 1990.

Nessa época, os atletas cariocas dominavam o cenário no Brasil. Nestas competições, você percebia claramente essa diferença de performance entre os atletas do Rio e de outros Estados?

Sim. Existia uma diferença grande! A qualidade das ondas no Rio é um diferencial. As informações também chegavam lá primeiro. Os atletas tops estavam no Rio e isso fazia uma diferença tremenda. Durante dois ou três anos viajei muito ao Rio para quase todos os campeonatos, e isso, também ajudou muito na minha evolução.

Quem eram seus principais amigos de treino e de viagens?

Aqui em São Paulo, a Claudia Ferrari, que sempre me ajudou e viajávamos quase sempre juntos. Depois de um campeonato em Alagoas, a Copa Cavalo Marinho, passei a ir a quase todos os campeonatos com o Guilherme Tâmega, e nos treinos do dia a dia tinha toda a galera aqui do Guarujá: Marcelo Mariano, Teco Shinzato, Silvano Gil, David Borges, entre outros

Quais foram seus melhores patrocinadores? Você conseguiu viver do esporte com a ajuda de custo que recebia?

Fui da equipe Morey Boogie, meu primeiro grande patrocinador. Depois vieram a Maikai, que me deu um suporte muito bom, e também a Ombak e a Hot Water. Agora… viver do esporte, eu nunca consegui.

Em que ano se tornou profissional e como foi essa transição? Seus patrocinadores chegaram juntos nessa fase?

Em 1990 fui campeão brasileiro amador, e como não era ano de mundial amador (os campeões brasileiros amadores ganhavam a vaga para disputar o mundial Amador no ano seguinte, mas em anos ímpares, não tinha Mundial), me profissionalizei. Mas com relação aos patrocinadores, alguns, foram apenas promessas.

Quais foram suas melhores colocações em campeonatos/circuitos e qual foi seu momento mais marcante no esporte?

Vice-campeão brasileiro amador 1989, Campeão Brasileiro Amador 1990 e quatro campeão estadual (SP). O momento mais marcante, sem dúvida, foi ter sido campeão brasileiro, sendo o primeiro atleta fora do Rio a ganhar esse título.

Papeleta de uma final histórica contra Guilherme Tâmega.

Teve uma etapa do Circuito Paulista, que você fez a final com o Guilherme Tâmega e você se sagrou campeão. Nessa final, provavelmente, tenha sido uma das baterias com a maior quantidade de “high scores” da história do esporte. Nos conte como foi essa bateria e se existe algum registro dela filmado?

Existe registro sim! No antigo programa Ombak, que passava na MTV. Agora, sobre o campeonato, foi uma etapa do Circuito Paulista, no Canto do Maluf, com boas ondas. Durante o campeonato todo vi várias pessoas tirando notas dez, coisa que até aquele campeonato, nunca tinha conseguido. Aí as fases foram passando, e acabei encontrando o Tâmega na final. Surfei o evento todo com uma prancha feita para o próprio GT. Era o mesmo shape que ele usava.

Na final, ele começou a bateria com uma onda média 6.00. Eu vim logo atrás em uma direita, dei um 360 e encaixei em um tubo que sai e manobrei até a beira. Nota 10 unânime! Aí vem ele e manda um aéreo cabuloso! 10 unanime também! Eu vim logo atrás e tive outro dez unanime! Na época, eram somadas as 3 melhores ondas e eu somei duas ondas 10 e uma 9,5 de média, sendo que GT teve um 10 e dois 8.5. Tenho essa papeleta até hoje em casa.

Que outros lugares fora do Brasil, já visitou para pegar onda ou competir e qual foi a melhor trip?

Fui apenas uma vez ao Havaí, na temporada de 92, e com certeza, foi minha melhor trip.

E como foi essa temporada havaiana?

Fui com a Claudia Ferrari, que me deu todo o suporte. Depois dividi o carro com o GT, Daniel Rocha e o Léo Gomes. Aí, foram dois meses de sonho, pegando altas ondas e sempre na água, um puxando o limite do outro.

No Brasil, quais eram suas ondas prediletas?

Paúba, com certeza, ainda é minha onda preferida, mas Itacoatiara, Posto 5, Laje de Stella Maris, entre outras, também tenho excelentes lembranças.

Quais eram suas manobras preferidas?

Aéreo e 360 invertido aéreo.

Qual o maior mar que já pegou e qual a situação mais cabulosa que enfrentou?

O maior foi em Pipe, uns 10 pés, no mar do campeonato Mundial. Apesar de não estar competindo, fui caddie de algumas pessoas, e entre uma bateria e outra, dava para pegar uma onda. A situação cabulosa, foi uma vez na Paúba, que bati a cabeça no fundo e fiquei tonto e com dificuldade para sair do mar e um amigo me ajudou. Depois deitei na areia e fiquei zonzo por uns 20 minutos.

Entocado nos tubas de Paúba.

E qual foi sua sessão épica que até hoje está gravada em sua memória?

Fiquei algum tempo sem pegar onda, quase dois anos sem entrar no mar, e depois desse tempo, fui voltando a surfar e indo várias vezes a Paúba, mas teve uma em especial que eu fui num domingo e o mar estava clássico, com vários amigos na água e altas ondas. Este dia, foram quase dez horas dentro da água.

Quando você parou de competir profissionalmente?

Em 1992 eu parei, mas em 1995 ainda competi na etapa do mundial aqui do Guarujá. Vim desde a primeira fase até o evento principal, passando várias fases e perdi nas oitavas, numa bateria com Jeff Urdan e o Rogério Biola. Nesse evento eu ainda ganhei do Mike, mas nós dois fomos desclassificados nesta bateria (risos). Eu em terceiro e ele em quarto.

Após sua parada das competições, você manteve uma rotina de treinos ou deu uma parada total?

Pegava onda esporadicamente, mas cheguei a ficar quase dois anos sem entrar na água… aí fui voltando a surfar, mas com pouca frequência.

Você concluiu os estudos? Qual é sua formação?

Tenho o segundo grau completo e vários cursos de especialização na área que eu trabalho.

Onde você mora atualmente e o que faz profissionalmente?

Continuo morando no Guarujá e hoje sou o comandante de um iate de 76 pés.

Você está à frente do Circuito Paulista. Qual foi sua motivação em retornar ao esporte como dirigente esportivo?

Eu estava totalmente afastado do esporte há pelo menos três anos e acompanhava apenas pela internet e nem entrava na agua essa época. Aí o Rogério Bezerra, que é juiz da APB e um grande amigo, me intimou a assumirmos a Federação Paulista. Aí a chama reacendeu, e estou na luta há quase 8 anos para reerguer o esporte.

Há dois anos montamos uma nova diretoria na FEBBESP, formada de atletas e ex atletas. Ano passado conseguimos fazer um circuito com 3 etapas, em cidades diferentes, com premiação em dinheiro para os profissionais.

Como dirigente, Adilson Junior está à frente do Circuito Paulista.

Como dirigente, você deve estar percebendo o quão difícil está o mercado, patrocínios… O que você acha que o esporte precisa para retomar o brilho de outrora?

A dificuldade é enorme! Aqui em São Paulo, o Estado mais rico do país e não conseguimos uma empresa forte para bancar um circuito. Precisamos de uma gestão mais profissional, fazer as coisas apenas por amor ao esporte não é a coisa mais viável.

Agora no segundo semestre firmamos uma parceria com a Experience One que está viabilizando a venda dos eventos do circuito estadual. E também esta nova diretoria da CBRASB, que desde o ano passado, vem fazendo um trabalho de reconstrução do cenário das competições em nível nacional

Na minha opinião, você foi o maior nome do Bodyboarding Paulista de todos os tempos. Por quê até hoje não surgiu um novo “Chumbinho” vindo de SP?

Eu tive a sorte de participar dos anos de ouro do esporte, do Circuito Brasileiro com o Castelinho (89/90), o circuito carioca com patrocínio da Fidji, circuito Paulista com patrocínio da Morey Boogie/Hot water. A visibilidade desta época era enorme! Os patrocínios davam suporte nas viagens e tudo mais. Hoje você conta nos dedos o atleta aqui de SP que tem um patrocinador que dê suporte para ele ir a um evento de nível nacional.

Como está o nível da nova geração de atletas paulistas? Aponta algum destaque para explodir nas competições ao redor do Brasil?

Temos uma safra nova. O que falta realmente é apoio. Temos aqui no Guarujá o Projeto “Amigos do Mar” e o ABK, que são projetos sociais com mais de 70 crianças. Em Mongágua, o Thiago Jacob e a Thelma, também tem projetos sociais. Precisamos apenas de apoio para mandar essa molecada para os eventos. Tem também os que já tem visibilidade em nível nacional, como o Valdomiro Mirinho, top do circuito Brasileiro, e Abner Scopetta.

Chumbinho foi vencedor do antigo prêmio Fluir de Bodyboard.

Chegou a hora boa, que todo mundo gosta…Das histórias, dos “causos”!!! Abra o baú e nos conte algumas que ficaram marcadas na sua memória, que quando lembra, até hoje dá boas risadas

Primeiro os “causos tristes”: etapa do Guarujá, Praia do Tombo, semifinal, mar grande, eu e GT novamente, e os dois sem ouvir a locução. Pego uma onda, chego na beira faltando um minuto e a praia inteira em silêncio. Aí ouço a locução dizendo: “Guilherme, você precisa de 9 pra virar a bateria” e ele no outside sem ouvir isso. Na regressiva ele dropa, cava e bummm… Rolo aéreo monstruoso, volta no corte da onda, e na junção bummm… outro Rollo e faz a onda até a beira e termina ela do meu lado perguntando se eu sabia quem tinha ganho. Eu olho e dou risada. Aí a locução repete o quanto ele precisava e depois começa a soltar a nota desta última onda. Resultado: 10 unânime e virou a bateria na regressiva.

Agora outra…  Final na Barra da Tijuca, circuito Brasileiro de 1991, mar marola, eu com chances de título, aí perco na segunda fase da triagem. Vou saindo do mar e olho na direção onde tinham alguns atletas e vejo uma galera comemorando a minha desclassificação.

Também fui caddie do GT no campeonato Mundial de Pipe (1992). Uma cena no mínimo hilária! Ele na final, voltando para o outside, me gritando e dizendo que estava pelado, e eu sem muito o que fazer lá dentro, subi no jet-ski de apoio e fui até a areia e fiquei perguntando a galera se eles tinham alguma bermuda sobrando. Neste mesmo momento, olho para o outside e vem ele em uma onda da serie, pelado (risos)!

O que sente mais saudade daquela época?

Os amigos que fiz, as viagens, encontrar sempre a galera nos eventos. Isso realmente era muito legal!

Qual sua impressão do estágio atual do esporte, tanto em performance quanto em organização?

Em performance, não precisa dizer nada. A galera quebrando no circuito mundial e brasileiro, tanto no masculino como no feminino. Falta mais apoio aos atletas para o circuito mundial. Quanto a organização, a etapa de Itacoatiara do mundial esta aí há vários anos, muito bem organizada pelo Giu Lara, e a retomada do circuito nacional, com esta nova diretoria, só vem a reforçar o esporte.

O que o bodyboard representou na sua vida?

Representou muito! Fiz amigos e conheci lugares, que certamente, sem ele, nunca teria ido.